quinta-feira, 22 de outubro de 2009

ENTREVISTA COM JOÃO REAL PEREIRA PCA DO BANCO-BCA

Desde que venceu a privatização do Banco Comercial do Atlântico (BCA), em 2000, o Grupo Caixa Geral de Depósitos (CGD) assumiu-se como banco de referência da banca em Cabo Verde. Ao leme está João Real Pereira, 54 anos, para quem Cabo Verde "vale a pena".
Desde Fevereiro de 2000 que a CGD está como principal accionista do BCA. Em Fevereiro de 2010, fazem dez anos. Valeu a pena?
Valeu a pena, sem margem para dúvidas. A CGD investiu no BCA contribuindo para reforçar o papel do BCA como banco de referência do sistema financeiro cabo-verdiano. O BCA é um banco com boa solidez financeira, desfrutando de um enorme capital de confiança. Para a CGD, tem sido um caso de sucesso de internacionalização. Para as autoridades cabo-verdianas foi um caso de sucesso de privatização que tem correspondido às expectativas de modernização do BCA e de contribuição do BCA para a sofisticação do sistema financeiro cabo-verdiano. A presença da CGD em Cabo Verde complementa e potencia duas outras áreas de intervenção da CGD: por um lado, financiamentos directos à economia cabo-verdiana, em particular no sector das infra-estruturas. Por outro lado, a CGD tem sido instrumental na excelente cooperação entre os Estados de Cabo Verde e Portugal, a qual tem trazido vantagens recíprocas.
O que levou a CGD a investir no BCA, criado em 1993?
A CGD está presente em Cabo Verde, primeiro por sua iniciativa, quando abriu uma sucursal, posteriormente transformada no Banco Interatlântico. Mais tarde, a CGD volta a estar presente porque, respondendo positivamente a um convite das autoridades cabo-verdianas, concorre à privatização do BCA e ganha o concurso. Esses factos demonstram que, para a CGD, Cabo Verde é um mercado estratégico. Com a privatização, a presença do Grupo CGD alargou-se ao sector segurador, sendo o maior accionista da Garantia, que é a maior empresa de seguros em Cabo Verde. A CGD também é o maior accionista da Promotora, a única empresa de capital de risco em Cabo Verde.
Houve todo um percurso que foi necessário percorrer ao longo de quase uma década. Considera que, para já, os resultados são satisfatórios?
Mais que satisfatórios, considero que os resultados têm sido muito bons. O BCA continua a ser o líder do sistema bancário e, quer nos Particulares, quer nas Empresas, é o maior banco do sistema. E é também o mais rentável.
Ao longo do tempo houve um processo de transformação interno com melhorias evidentes na sua capacidade de análise de risco e adopção das melhores práticas bancárias. A modernização do banco tem sido feita gradualmente, sem quaisquer convulsões e com a adesão plena dos colaboradores, que são o melhor activo do BCA. Por outro lado, o BCA tem dado o seu contributo para a modernização do sistema financeiro de Cabo Verde, quer por iniciativa directa, quer em articulação com outras entidades, designadamente a SISP (Sociedade Interbancária), no que respeita ao sistema de pagamentos, e a Bolsa de Valores, no que toca à dinamização do mercado de capitais. Finalmente, não obstante os resultados, tenho consciência de que é preciso vencer outros desafios entre os quais refiro, a título de exemplo, o da internacionalização do BCA, na perspectiva de melhor servir os cabo-verdianos residentes na diáspora.
O BCA tem registado resultados acima das expectativas ou estão dentro das previsões? Acha que há margem de progressão? E em que sectores?
Os resultados de 2007 e 2008 foram muito bons, acima das expectativas. A margem de progressão depende das oportunidades que a economia cabo-verdiana venha a oferecer.
Estou optimista, porque há sectores onde, havendo enormes carências, há vontade em investir. Essas oportunidades existem, quer nos particulares, designadamente na habitação, quer nas empresas, particularmente nas infra-estruturas portuárias e viárias, e, claro está, no Turismo.
E quais foram os resultados de 2008, do ponto de vista do crescimento de Banco?
Os resultados de 2008 corresponderam a um lucro de cerca de nove milhões de euros (975.000 milhões de escudos cabo-verdianos), o melhor resultado de sempre do BCA. Foi um ano excepcional, em que se não sentiram, ao contrário de 2009, os efeitos da crise internacional. O BCA tem sistematicamente reforçado os seus capitais próprios, através dos resultados que ficam em grande parte no banco. Simultaneamente, com o crescimento dos lucros, o BCA tem distribuído aos accionistas um montante de dividendos progressivamente maior.
Recentemente, os accionistas do BCA deliberaram aumentar o capital do banco, aumento esse já concretizado, o que demonstra que os accionistas estão decididos a apoiar o crescimento futuro do BCA.
As empresas portuguesas e cabo-verdianas têm recorrido aos serviços do BCA para os seus investimentos?
O BCA é simultaneamente um banco de Particulares e um banco de Empresas. Na carteira de crédito do BCA, os dois segmentos têm um peso quase igual. As empresas cabo-verdianas, na sua generalidade, têm o BCA como o seu primeiro banco e, frequentemente o único. Tendo em conta a maior dimensão do balanço de BCA, este é, para as grandes empresas, o único que tem capacidade, por si só, de satisfazer as suas necessidades de financiamento. A confiança dos nossos clientes é o nosso maior prémio, pelo que o BCA não precisa de comprar prémios para se distinguir no mercado cabo-verdiano. As empresas portuguesas recorrem frequentemente ao BCA, directamente ou via CGD, quer para aconselhamento quer para financiamento.
Então a crise económica e financeira mundial não tem prejudicado as actividades do BCA?
A crise económica e financeira mundial tem estado a ter reflexos na economia cabo-verdiana. O investimento externo nos sectores do Turismo e da Imobiliária Turística decresceu significativamente. Como o sector do turismo é o motor da economia cabo-verdiana, a desaceleração teve impacte significativo no restante tecido económico e, consequentemente, propagou-se ao sector financeiro.
No que respeita ao BCA, os impactes existem mas são bastante reduzidos, considerando que a exposição do banco aos sectores mencionados é pouco importante e existem outros sectores da economia que têm revelado um bom dinamismo, designadamente o sector da habitação direccionada para o mercado local e o sector das infra-estruturas públicas, que são estratégicos para a actividade do banco e que têm estado imunes à crise.
O sector da Banca em Cabo Verde tem, então, sabido estar à margem dessa crise?
A crise internacional afectou directa ou indirectamente uma parte significativa do tecido económico cabo-verdiano. Por outro lado, com o aumento do desemprego e dos salários em atraso, o crédito em incumprimento no sistema financeiro aumentou tanto nas empresas como nos particulares, à semelhança do que se passou no resto do Mundo. Mas acredito que, globalmente, a crise não afecte significativamente o sistema financeiro. No caso particular do BCA, estamos permanentemente atentos à evolução do crédito vencido, por forma a mantê-lo, como tem acontecido, nos limites desejados.
O que vai fazer o BCA no futuro? A expansão da rede de agências vai continuar?
O BCA é o único banco que cobre todo o território de Cabo Verde, através das suas 28 agências. No entanto, entendemos que há necessidade de aumentarmos a rede de agências, designadamente na Cidade da Praia. A par desse reforço futuro, iremos inaugurar ainda este ano, novas agências em (a ilha de) Santo Antão e na Assomada (40 quilómetros a norte da Cidade da Praia).
Por outro lado, vamos modernizar as restantes agências que ainda não beneficiaram de obras. O BCA está também a estudar a oportunidade de desenvolver novos produtos financeiros, entre os quais o Leasing. Por último, pretendemos encontrar novas fórmulas de reforçar a nossa presença junto das principais comunidades de cabo-verdianos na diáspora.
Considera que as condições do mercado cabo-verdiano são interessantes para o empresariado português?
O mercado cabo-verdiano é interessante para se investir em vários sectores económicos. Sobretudo nas infra-estruturas, turísticas, portuárias, viárias e de saneamento, habitação, em particular a social, energias alternativas, designadamente a eólica, e pesca, além, naturalmente, dos serviços.
Que condições/garantias/vantagens pode o BCA oferecer aos empresários portugueses que queiram investir em Cabo Verde?
O BCA oferece o seu conhecimento da economia cabo-verdiana para, com os investidores, estudar a viabilidade dos seus investimentos. O BCA dispõe de toda a gama de produtos de financiamento e, caso o montante do financiamento ultrapasse a capacidade do banco, pode procurar sindicar a operação localmente ou com o Grupo CGD.
E que conselhos daria a um empresário português para o convencer a investir em Cabo Verde?
Cabo Verde, pela sua estabilidade política, económica e social, é um país que oferece condições interessantes para investir. Há ainda um conjunto significativo de incentivos ao investimento, designadamente na área fiscal e aduaneira. Existe um Acordo Cambial com Portugal, que já tem dez anos, o qual visa garantir a paridade fixa entre o escudo cabo-verdiano e o euro, o que tem acontecido. Por outro lado, Cabo Verde dispõe de recursos humanos qualificados. No BCA, por exemplo, todos os funcionários do banco (440) são cabo-verdianos.
Por último, recomendaria que, sempre que possível, o investimento em Cabo Verde associasse parceiros locais. A geografia accionista do BCA também é disso exemplo, visto que, além da CGD, são accionistas do banco o Estado de Cabo Verde, a Garantia e empresas e particulares cabo-verdianas, detendo este último grupo 25% do capital do banco, o qual está em parte cotado na Bolsa de Valores de Cabo Verde.
OJE/LUSA-Por José Sousa Dias

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