domingo, 29 de novembro de 2009

CV(EXPRESSO)JORGE CARLOS FONSECA PEDE DEBATE "ALARGADO" E SERENO SOBRE O CRIOULO


Crioulo: JCF pede debate “alargado” e “sereno” (parte 3)
A oficialização da língua cabo-verdiana é tema da terceira parte desta longa entrevista que vimos reproduzindo, do jurista e jurisconsulto, Jorge Carlos Fonseca, à Rádio Atlântico. "Os defensores do crioulo não podem fazer chantagem", adverte, considerando que é necessário muita reflexao em torno do crioulo.
Outro assunto que faz parte da actualidade cabo-verdiana é a oficialização da língua cabo-verdiana. O Senhor é Jurista, Professor, Escritor...
Mas eu não sou lingüista, mas posso talvez dar a minha opinião como cidadão, escritor... (Risos)
Queria a sua opinião como cidadão sobre este dossiê "oficialização ou não da língua cabo-verdiana". Será a altura certa para a oficialização do crioulo? Há pouco tempo na Holanda o Ministro da Cultura disse que se os Deputados não chegarem a acordo nesta matéria a História acabaria por julgá-los...
Se o Ministro usar as expressões como está a dizer eu acho um pouco "forte". É claro que o debate em torno da oficialização da língua cabo-verdiana e sobre o ALUPEC tem sido um debate acalorado. Dá-me impressão às vezes que esse debate devia ser um debate mais alargado e um debate mais sereno e mais objectivo.
Se eu como cidadão, professor e escritor, tenho muitas dúvidas, imagine então um cidadão comum, de certeza deve ter mais dúvidas do que eu. Eu não acho correcto e nem o método mais eficaz para que as pessoas estejam convictas de que, por exemplo, a oficialização do crioulo, a institucionalização do ensino do crioulo, seria até uma forma de defesa de crioulo e da própria língua portuguesa paralelamente. Eu sei que alguns lingüistas defendem isso, falo por exemplo de José Luís Hopffer Almada ou Mário Fonseca - meu falecido irmão que não era lingüista mas era um escritor -, que defendem que a opção pelo crioulo evita algo que temos agora que é a chamada diglossia, uma interferência nociva de uma língua noutra.
Defendem que é devido a uma diferença grande em termos de gramática entre essas duas línguas e que por isso as pessoas falam mal o português, aportuguesam o crioulo etc.
Eu como professor universitário, tenho verificado que a língua portuguesa em Cabo Verde está num estado difícil, quase calamitoso, é impressionante... Se o português é a língua oficial temos que tratá-la como deve ser. O mesmo se pode dizer noutros segmentos da população, mesmo junto de quadros formados em escolas portuguesas ou brasileiras. É um fenómeno generalizado. Se a oficialização do crioulo contribuir para a sua afirmação, afirmação da identidade, e servir para introduzir outros métodos mais eficazes para o ensino da língua portuguesa, estou de acordo, mas como não sou lingüista, não sei se isso é verdade ou não, se é seguro o não.
O problema é que essa questão coloca muitas dúvidas aos cabo-verdianos e dúvidas complicadas que podem trazer preconceitos bairristas como, por exemplo, uma eventual imposição da variante de Santiago aos outros. Portanto, se não for assim é preciso que quem de direito explique isso às pessoas. É preciso que haja um trabalho pedagógico e paciente.
Os defensores do crioulo não podem fazer chantagem, dizendo, por exemplo, que as pessoas que são contra são alienados, não são patriotas ou nacionalistas. Ser cabo-verdiano ou ser patriota não tem nada a ver se se gosta ou não do ALUPEC como é evidente. Mas falo de alguns, de um segmento mais radical, quase fanatizado e isso não é bom. A Constituição revista em 1999 diz que o Estado deve criar condições para a oficialização do crioulo.
Houve um diploma, creio, que institui o ALUPEC a título experimental, o que a Lei previa era a avaliação, estudos de impacto, mas parece que não foram feitos. Há pessoas que dizem: mas já houve vários colóquios, debates, conclusões e recomendações com especialistas sobre a matéria. Mas eu penso que não é um problema só de especialistas mas sim um problema de cidadania. É preciso ouvir escritores em língua portuguesa, professores, enfim, os cidadãos no geral. Quando há uma agenda política que pressiona para que o Alupec seja aprovado, poderá ter um efeito perverso, como diz o ditado: "o tiro pode sair pela culatra", pode criar resistências, muitas pessoas resistem ao ALUPEC porque alguns defensores do ALUPEC são fanatizados, quer dizer, é um discurso quase de ameaça: "quem não é ALUPEC é contra Cabo Verde, não é patriota, é alienado, é colonialista" etc. Quer dizer, isso não é a forma mais correcta de convencer as pessoas a aderirem à proposta de oficialização do crioulo ou então o outro problema autónomo que é o problema do ALUPEC. Repare, temos que ver o debate sobre a oficialização do crioulo em outros aspectos. Os custos que acarreta. Nesta fase de crise, dos problemas por que passa o país, pode-se questionar se é uma prioridade... Sobretudo tendo em conta os custos. Oficializando o crioulo, por exemplo, o Boletim Oficial tem que ser feito nas duas línguas. Se se aprova um Código Civil, tem que ser feito também em crioulo, chega uma entidade oficial de visita a Cabo Verde é preciso ter tradução em português e crioulo. Eu por exemplo, estive a lecionar em Macau que tem duas línguas oficiais - o Chinês e o Português - todos os documentos têm que ser traduzidos nas duas línguas e isso acarreta custos elevadíssimos. Macau consegue pagar porque tem condições para fazê-lo mas aqui em Cabo Verde não sei se teremos condições neste momento para o fazermos.
Então acha prematura a oficialização...
Eu acho que se devia fazer um esforço e retomar esse debate, alargar o debate, estendê-lo e que interlocutores de um lado e do outro tenham uma postura mais dialogante, mais tolerante, mais pedagógica, mais didáctica, para que as pessoas possam entender o que está realmente em jogo, para que as pessoas de Santo Antão a Brava possam entender bem do que se trata, para que, por exemplo, os da Brava ou de S. Nicolau não possam pensar que tem que falar "Badio" ou os de Santo Antão não pensarem que vão falar o crioulo de "Assomada", caso contrário será um problema.
Acha que o debate sobre o assunto deve ser mais socializado talvez.
Sim, é preciso de facto que seja mais socializado a bem de todos.
EXPRESSO DAS ILHAS-Por Norberto Silva

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