sábado, 26 de junho de 2010

CV(ANAÇÃO)ENTREVISTA COM A.PEREIRA NEVES PCA DOS TACV

PRAIA-Mesmo num contexto internacional desfavorável ao negócio aéreo internacioal e de críticas provenientes de alguns sectores da sociedade, a Transportadora Aérea Cabo-Verdiana (TACV), registou um crescimento de 14% no 1º trimestre de 2010.
Este é apenas um dos vários resultados da gestão de António Neves, que apesar de considerar que “a Companhia começou a respirar, afirma que a Empresa está confrontada com “problemas estruturais e de contexto graves”.
Ainda assim, contiua determinado a mudar o estado de coisas que encontrou há dois anos e enumera como ganhos da sua gestão, entre outros, o pagamento regular aos fornecdores, o pagamento atempado dos salários, a liquidação de mais de 600 mil contos da dívida encontrada, a reconquista dos operadores turísticos internacionais, a renovação do Certificado IOSA e a entrada da TACV como membro de pleno direito da IATA.
A NAÇÃO - As críticas à TACV chovem por todos os lados. Os clientes e fornecedores da Companhia têm mais razões para criticar a Empresa hoje do que quando assumiu a Administração?
António Pereira Neves - Não tenho a percepção de que chovem críticas de todos os lados. Vamos ser justos. As situações que envolvem a TACV são muito mediatizadas e não raras vezes apresentadas como verdadeiros escândalos. Há muitos interesses em torno da TACV e, não poucas vezes, há a tentação de aproveitamento de situações que acontecem para outros fins que não a crítica séria, justa, honesta e construtiva. Todas as companhias aéreas registam atrasos e cancelamentos. Estes devem-se a razões diversas: avarias, condições atmosféricas adversas, cumprimento dos requisitos de planos de voo, transporte de doentes, deficiências na programação e problemas de gestão de tripulações. O que podemos garantir, suportados em estatísticas, é que os dois últimos factores, que são os que estão sob controlo da TACV, respondem, actualmente, por um número significativamente inferior de irregularidades que temos registado.
Isso significa avanço ou recuo?
É um avanço extraordinário relativamente ao início do nosso mandato. Só os desatentos e aqueles que querem pintar a TACV com as cores do seu desejo é que não reconhecem isso. Os outros factores impedem-nos de descolar porque não podemos, em caso algum, pôr em causa a segurança das nossas operações por razões óbvias ou porque não podemos deixar de transportar doentes evacuados de umas ilhas para outras onde podem contar com melhores cuidados. Devo dizer, como alguns se recordam, que, no ano passado, a nossa operação foi grandemente afectada pelas condições atmosféricas: época chuvosa prolongada em Cabo Verde e Inverno extremamente rigoroso na Europa e nos Estados Unidos. Ficámos muitas vezes impossibilitados de voar e, consequentemente, de facturar. As situações de irregularidades são sempre muito difíceis de gerir em qualquer companhia. Pior numa companhia com uma frota à justa em que não há flexibilidade operacional e disponibilidade para avançar com um outro aparelho quando por qualquer motivo um outro não pôde descolar no horário previsto. No nosso caso concreto, as irregularidades constituem uma espiral e são muito custosas em razão da protecção de passageiros a que estamos obrigados por lei: hotel, alimentação, transporte, etc. Não somos masoquistas: as irregularidades são penalizantes para a nossa imagem, desconfortam os passageiros e originam uma hemorragia de recursos financeiros. Continuaremos a trabalhar na consolidação e melhoria do nosso sistema global de produção.
MELHORAR A COMUNICAÇÃO
O staff da TACV trata os clientes e passageiros com arrogância. Partilha desta constatação do público?
Sinceramente que não diria, nem sinto isso. Reconheço que temos muitos problemas de comunicação e que nem sempre agimos com prontidão e eficácia. O atendimento no transporte aéreo, especialmente em situação de irregularidade, é muito sensível devido ao estado de tensão e estresss que se gera. Os atendedores e responsáveis de assistência a passageiros devem ter muita calma e serenidade para explicarem e esclarecerem os clientes, e eles são treinados para isso. Entretanto, o ambiente que se cria com o descontentamento de passageiros que não podem cumprir o seu plano de voo, que perderam o seu compromisso no destino, que não podem chegar a tempo para o baptizado ou a festa de aniversário, etc. é susceptível de descambar para o conflito, e não raras vezes isso acontece. Sobretudo, quando aparece alguém a tirar proveito da situação, como ocorreu, recentemente, no Aeroporto Internacional da Praia, quando foi necessária a intervenção policial. Temos de continuar a qualificar os nossos serviços de assistência em terra, para podermos prestar um serviço de cada vez maior “standing” neste particular.
A comunicação com os passageiros e com o público tem sido muito deficitária. O que mudou e o que vai mudar nessa área?
O propósito é continuar a mudar e a melhorar. Temos vindo a fazer esse percurso. Como disse já, o melhor mesmo era não termos irregularidades na nossa operação. Quando há atrasos e cancelamentos devido aos factores acima apontados, a situação é dificilmente gerível. Nunca se consegue ter sucesso absoluto. Por exemplo, em matéria de informação aos passageiros, há sempre aqueles que não são contactados porque não deixaram um meio de contacto ou porque a comunicação devia ter sido assegurada pela agência onde adquiriram o seu bilhete. Quando atrasamos um voo para transportar um doente não se sabe se o voo seguinte vai ser realizado porque toma-se muito tempo com a operação e podemos atingir o pôr-do-sol que nos impede de seguir para o próximo destino programado. Por isso é que eu digo que é complicado. Como temos de conviver com irregularidades o que temos de fazer é tornar cada vez mais eficiente o nosso serviço de Call Center e fazer um uso mais intensivo de todos os meios de comunicação e de informação e não apenas do telefone. As informações no aeroporto também devem ser melhoradas. Já estamos a tratar disso, mas reconheço que os resultados são mitigados.
FIDELIDADE
Como justifica que o destino Portugal, um dos mais solicitados, tenha uma das tarifas mais altas do mercado, sobretudo quando há maior procura?
Importa dizer que nas rotas de e para Portugal existe um acordo de “code share” que deve ser respeitado pelas partes. A TACV é fiel ao compromisso e pretende continuar a sê-lo. Relativamente à segunda parte da sua pergunta, deve compreender que essa é uma das regras de ouro do sector: quando há maior procura, as tarifas são também mais altas. Todas as companhias do mundo funcionam assim. Incluindo as chamadas “low-cost”. E aceita-se que assim seja tendo em conta a sazonalidade do negócio de transporte aéreo: factura-se bem na época alta e assim-assim e pouco nos períodos baixos.
Muitas pessoas defendem que a TACV já teve dias melhores. O que há de justo nesta apreciação?
Não tenho elementos para informar. O que posso assegurar com dados objectivos e insuspeitos é que a TACV está melhor do que quando esta Administração iniciou o seu mandato. Do ponto de vista comercial, recuperámos mercado étnico e regressámos ao segmento turístico. Temos bons contratos para este Verão. Inaugurámos a linha Mindelo/Lisboa a 30 de Abril último. Lançaremos nos próximos dias a terceira frequência Praia/Bóston, depois de termos avançado com a segunda frequência em Março do ano passado. Retomaremos a ligação com Madrid também brevemente. Os voos Nice/Praia terão o seu início a partir de 2 de Julho próximo. O objectivo é torná-los regulares contando com o mercado senegalês. No primeiro trimestre deste ano, crescemos 14 por cento (%) em número de passageiros transportados, em relação ao período homólogo anterior. A taxa de ocupação dos aparelhos progrediu de 53% para 61%. Isso significa que crescemos com eficiência como, aliás, convém a uma companhia que está a sair de um período muito complicado. Acresce que crescemos em todos os mercados ou segmentos (doméstico, regional e internacional). Há mais confiança do mercado e dos seus protagonistas na TACV. Neste mandato também foi estruturado (em tempo recorde como muitos se lembram) o nosso serviço de handling na Boa Vista e no Mindelo e reequipadas as outras escalas num investimento global que ultrapassou os 200 (duzentos) mil contos. Poucos acreditavam que o pudéssemos fazer. Foram informatizados os serviços de check-in em S. Filipe, respondendo a uma reclamação antiga de melhoria dos serviços prestados aos nossos clientes do Fogo. Reforçámos e expandimos os serviços de segurança (security) da Companhia como mandam os regulamentos.
E como estão do ponto de vista técnico-operacional?
A TACV renovou e conquistou novos certificados. Somos membros de pleno direito da IATA, desde Novembro de 2009. Estamos no registo IOSA até Dezembro de 2011. Ajudamos o País a passar com sucesso a auditoria ICAO, no ano passado. Vendo o aspecto financeiro, conseguimos aguentar as muitas irregularidades do ano passado (despesas com protecção de passageiros devido a cancelamentos e atrasos) e as avarias num dos nossos Boeings. Pagámos mais de 600 mil contos de dívidas acumuladas nos exercícios anteriores. Acertámos as nossas dívidas com o fisco e com a segurança social. Limpámos todos os descobertos bancários contraídos em 2008. Hoje pagamos regularmente aos fornecedores de combustível, aos fornecedores de serviços de “handling” e a outros fornecedores. Aparte o mês de Outubro de 2009, nunca mais tivemos problemas em pagar pontualmente os salários. Não queremos dizer com isso que não temos problemas. Longe disso: temo-los e são complicados, sem dúvida. Mas não se pode ignorar o que já foi cumprido. Nem passar uma esponja sobre a obra feita só porque isso não convém aos desígnios de determinados sectores ou porque não ajuda aos fins que perseguem.
FRAGILIDADE COMPETITIVA
Há uns anos, o Governo ambicionou fazer da TACV uma companhia aérea moderna, competitiva e poderosa. O que terá falhado?
Esta deve ser a ambição de um governo em relação à Companhia aérea de Bandeira do País. É também a ambição da actual Administração. Hoje, com maior conhecimento do negócio e da TACV, estou convicto de que esse objectivo é alcançável. Temos é de continuar a trabalhar com convicção, com determinação e com ideias. E de encontrar as respostas mais apropriadas e adequadas aos problemas e dificuldades. Também não podemos desperdiçar oportunidades, mas temo muito que os nossos problemas financeiros nos forcem a isso.
Numa entrevista polémica concedida a este Jornal, considerou que o Governo devia assumir que tinha falhado na TACV. As coisas mudaram?
Já estava à espera desta. O facto de o Governo ter mudado de estratégia veio em boa hora. Isto está claro para toda a gente honesta, séria, imparcial e que não está interessada em utilizar a TACV para fins escusos ou inconfessos.
Os problemas da TACV são estruturais ou conjunturais?
Estamos confrontados com problemas estruturais e de contexto, graves e difíceis de ultrapassar. A nossa estrutura técnico-organizativa padece de ineficiências específicas que nos colocam numa posição competitiva muito fragilizada. Veja-se, para começar, o que nos impõe a nossa configuração arquipelágica, com distâncias curtas e várias aterragens e descolagens para servirmos as ilhas e as populações. Repare-se nos custos que temos de incorrer para o posicionamento das tripulações para os voos internacionais. Tenha-se em conta a rigidez e inflexibilidade da legislação laboral em matéria de imposição de disciplina e profissionalismo num sector extremamente regulado e que deve funcionar segundo regras e padrões estritos de segurança e em que, por isso mesmo, o absentismo, a falta de assiduidade, o não-cumprimento de horários, e a negligência causam prejuízos enormes…
Há outros problemas estruturais?
Existem! Por exemplo: a obrigação imposta por Lei de a TACV proteger os passageiros, mesmo quando os atrasos e cancelamentos são originados por factores fora do controlo e acção da TACV ou as pesadas taxas que a TACV é obrigada a pagar pela utilização de serviços fornecidos pela ASA (única fornecedora). Mas há mais: os problemas de natureza conjuntural. A escalada dos preços de combustível ocorrida em meados de 2008, deixou sequelas em todas as companhias aéreas, e a TACV não foi excepção. A crise financeira e económica internacional do ano passado reduziu a procura de viagens e diminuiu o tráfego de passageiros. As companhias europeias e norte-americanas atravessam a sua maior crise de sempre. Só as companhias asiáticas e latino-americanas conseguem ainda trabalhar no azul. As recentes medidas de ajustamento orçamental e de redução do défice público tomadas na zona euro vão impactar muito negativamente a procura e as viagens. Veremos as consequências financeiras para as companhias. Diria que hoje pairam muitas incertezas sobre o futuro imediato do sector de transporte aéreo: depois de um optimismo moderado no início do ano sustentado nos primeiros dados de tráfego conhecidos, o pessimismo parece voltar devido ás medidas restritivas que estão a ser adoptadas pelos governos europeus. A TACV faz parte deste mundo e sofre com ele como as outras companhias aéreas.
GESTÃO PROFISSIONAL
O que é preciso mudar-se na Gestão da TACV?
Temos de ter cada vez mais uma gestão profissional. Ter uma linha de rumo e orientação, prosseguir com determinação a realização dos objectivos almejados, ser reactiva às alterações na envolvência e nas circunstâncias do contexto e ter força suficiente para não se deixar abater pelo stress devido à maledicência e injúrias gratuitas, pelas resistências às mudanças que devem ocorrer e perante as dificuldades de percurso, sejam elas de que natureza forem. A gestão deve também ser cada vez mais sensível aos seus constituintes, dialogando mais e esclarecendo melhor para uma cada vez maior identificação destes com as tarefas e objectivos da empresa. A liderança deve ser forte, determinada, esclarecida, mobilizadora e participada e estar à altura dos desafios a enfrentar.
A Companhia, no estado em que se encontra, está em condições de ser privatizada?
Continuo a achar que este não é o melhor momento para a privatização de uma companhia aérea, não só da TACV. Os dois últimos anos foram terríveis para o negócio de transporte aéreo e isso fez recuar os investimentos no sector. A Air France anunciou recentemente prejuízos recordes. A generalidade das companhias aéreas europeias e americanas estão no vermelho. Isto conta. Na recente reunião da IATA em Berlin foram apontados problemas que devem ser ultrapassados a nível internacional e nacional para tornar esta actividade mais atractiva. Os governos europeus estão preocupados com este sector cada vez mais essencial na circulação de pessoas e bens no mundo moderno. Então, prefiro não ter muitas ilusões. O que não quer dizer que não apoio a privatização da TACV ou que não reconheça que poderia contribuir para minorar a forte restrição financeira a que está sujeita a nossa actividade. Não desistimos mas devemos ser realistas e não cair em stresses e angústias se não a conseguirmos concretizar.
Falou-se em tempos, numa parceria estratégica com outras companhias aéreas e operadoras turísicas internacionais. O que há de concreto nesta matéria?
As parcerias entre as companhias aéreas são um instrumento usado para tornar mais eficiente o sistema de distribuição e a rede de linhas das operadoras aéreas. As alianças são hoje essenciais. Ninguém sobreviverá fora de acordos e alianças. A TACV também está condenada a isso. Temos é que saber com quem casar para realizarmos o objectivo de ter uma empresa moderna, sólida e sustentável. O futuro está na consolidação e não na proliferação e atomização, mormente em mercados pequenos e com reduzido tráfego natural. Deve-se, do meu ponto de vista, compreender esta dinâmica e retirar as devidas consequências. De concreto, há entendimentos comerciais com algumas companhias aéreas. Com os operadores turísticos temos desenvolvido e aprofundado as relações comerciais. A nossa operação neste Verão está muito suportada nos acordos com operadores turísticos. Hoje já é possível alargar e diversificar os negócios com esses operadores depois das medidas que tomámos de consolidação no sector de produção, de maior regularidade e estabilidade da nossa programação comercial e de uma confiança acrescida de que gozamos no mercado. Já estamos a trabalhar o nosso programa de Inverno IATA 2010 e as respostas têm sido muito positivas.
EMPRESA HANDLING
A anterior gestão reduziu significativamente os efectivos da TACV, mas a companhia continua pesada, com mais de cem pessoas por avião. Não pensa ser necessário o emagrecimento da TACV?
A sua apreciação falha num ponto: a TACV não é apenas uma operadora aérea. Ela é também uma empresa de handling. Deve-se ainda ter em conta a ineficiência que a regulamentação laboral impõe neste aspecto. De todo o modo, teremos algum pessoal excedentário em alguns sectores. Os ajustamentos não são feitos devido aos elevados custos decorrentes de processos do género. Não só financeiros, bem entendido. Podíamos era equilibrar a nossa estrutura regional de pessoal, mas também isso é difícil em razão da prática de contratos locais que existiu no passado, que nos impede, por exemplo, de transferir alguém de um ponto para o outro sem o seu consentimento.
A Companhia parece estar a gastar mais do que ganha; ter mais despesas que receitas. Estamos aqui numa lógica empresarial pura?
É uma situação insustentável. Ninguém nem nenhuma empresa se aguentam por muito tempo com um tal défice. Por isso mesmo, estamos a tomar medidas para equilibrar as nossas contas: cortámos e emagrecemos lá onde era possível. Continuamos o processo de racionalização da estrutura e dos custos para sermos mais eficientes. Tem de ser assim, é o único caminho portador de futuro. Agora, é verdade que o que estamos a fazer não chega, não é suficiente tendo em conta a forte descapitalização a que chegámos. Esta é uma situação muito difícil e crítica para a qual há que se encontrar uma saída. Estaremos a hipotecar o futuro se não se fizer, de uma forma ou de outra, a recapitalização da companhia.
AJUSTAR-SE AOS NOVOS TEMPOS
Qual o sector mais produtivo e o mais dinâmico da Companhia?
A Empresa no seu conjunto tem que ajustar-se aos novos tempos. O sector mudou e o mundo também. O 11 de Setembro de 2001 alterou radicalmente o negócio. As preocupações com a segurança vieram aumentar significativamente os custos das companhias aéreas. A desregulamentação e liberalização dos mercados aumentaram a concorrência e reduziram as tarifas. As companhias aéreas regulares são as que mais sofreram. Por isso, assiste-se hoje a um movimento de consolidação na indústria para ganhos de eficiência e de escala. A TACV tem de mudar para não ficar de fora deste movimento e do negócio. Mas também há que mudar a forma como encaramos o negócio de transporte aéreo em Cabo Verde e isso não é responsabilidade só da TACV.
A impressão é que se tem uma frota desajustada das ambições da Companhia. Confirma?
A ambição é uma coisa e a realidade é outra. Gostaria de ter uma frota internacional mais moderna de aviões mais eficientes e menos caros em termos de manutenção. Não foi possível fazer a renovação dessa frota, hoje temos de acomodar os custos e, por isso, somos menos competitivos. Gostaria de ter um avião de médio porte mais ajustado ao nosso tráfego em determinados períodos do ano, e não o tenho por razões financeiras e outras. Um avião que pudesse fazer o regional onde existe oportunidades que não podemos aproveitar em razão dos nossos problemas financeiros. Digo-lhe, entretanto, que estamos a concluir um estudo sobre a frota para ser discutido. Temos vindo a ter contactos com as duas principais construtoras de avião do mundo mas ainda não temos uma decisão.
INJUSTIÇA E MANIPULAÇÃO
Quais as suas linhas mais rentáveis?
As nossas linhas internacionais são hoje, globalmente, equilibradas, assim como as regionais. As operações domésticas são mais problemáticas mas trabalhamos para, pelo menos, as equilibrar.
A TACV tem uma dívida enorme para com a ASA. Como tem vindo a geri-la?
A TACV sempre teve dívidas enormes para com a ASA. É uma grande injustiça e pura manipulação dizer-se que a actual administração é incompetente e incapaz com base no montante da referida dívida. Isso foi passado para a opinião pública para se fazer o coro contra a TACV e os desmandos que determinados sectores insistem em fazer crer que acontecem na empresa. A diferença que existe, hoje, em relação ao passado, é que o Governo deixou de assumir tais dívidas por conta da Empresa. A outra diferença é que hoje a TACV poderá estar em condições de cumprir com as suas responsabilidades sem recorrer ao Governo como sempre, repito, sempre, aconteceu no passado recente. As taxas foram revistas para cima, em 2007, à revelia da TACV, que se manifestou contra. Em decorrência desse ajustamento, os custos para a TACV aumentaram significativamente, estando na origem da derrapagem e aceleração ocorrida ulteriormente. Em 2009, dissemos à ASA que não podíamos pagar a dívida acumulada, por causa dos problemas financeiros herdados e da prioridade que foi dada a outros compromissos.
 Que respostas obtiveram?
O Senhor Presidente do Conselho da Administração da ASA não compreendeu, não aceitou e fez aquilo que fez, em Dezembro de 2009, depois de alardear por aí que ia deixar os aviões da TACV no chão. Foi desonesto e desleal nas explicações que veio a dar ao público e ao Governo para justificar o injustificável. Há documentos e correspondências que comprovam o que estou a dizer. Este ano, fruto da melhoria da nossa situação financeira, a dívida acumulada até 31 de Dezembro de 2009 vem sendo paga, regularmente, e as receitas recebidas de terceiros têm sido transferidas normalmente. Entendemos, contudo, que as taxas são elevadas e que não correspondem à qualidade dos serviços prestados. Por isso, estamos a preparar o debate desta questão com a ASA, com a Autoridade Aeronáutica e com o próprio Governo, pois, não faz sentido capitalizar a ASA, descapitalizando a TACV. Também temos contas a apresentar à ASA pelos prejuízos que tivemos e que, pensamos, lhe devem ser imputados.
Será que a questão com a ASA teve solução política, já que têm as duas empresas públicas a mesma tutela?
Já respondi a esta pergunta.
QUIPROQUÓ COM A HALCYONAIR
E o quiproquó com a Halcyonair?
Não se trata de nenhum quiproquó. O assunto foi entregue aos tribunais e aguardamos uma decisão. Recorde-se que a TACV recorreu ao Tribunal depois de a Halcyonair ter falhado com todas as promessas e com todos os compromissos de liquidação da dívida. E este é um processo que vem desde 2009. A TACV não pode, como se compreende, financiar uma concorrente privada e, depois, pedir dinheiro ao accionista Estado para a sua recapitalização. Isso não faz nenhum sentido.
Causou alguma impressão na opinião pública que tenha querido a tolerância da ASA, ao mesmo tempo que estava intransigente com a Halcyonair, aparentemente pelas mesmas razões. Explique-nos isso.
As duas situações não são comparáveis. Por que é que a TACV deve ser tolerante com uma concorrente que lhe deve dinheiro? Que falha todos os acordos de pagamento que assinou! Que cada hora diz uma coisa para justificar o não-cumprimento de compromissos que assumiu! Isto é inconcebível e inaceitável num mercado aberto e concorrencial, e lamento muito que me considere intransigente quando procuro defender os interesses da TACV nesta matéria. O mais fácil seria assobiar para o lado e não criar caso! Mas não se conte comigo para uma tal farsa.
INÉDITO
Assumiu publicamente que o congelamento das contas da TACV pelo Ministério Público foi desproporcional. Que medidas pretende interpor para se ressarcir dos danos causados?
A correcção da primeira decisão da Procuradoria veio dar razão ao entendimento que, desde a primeira hora, a TACV teve sobre o assunto. Lamentamos que a Procuradora da Comarca da Praia tenha levado mais de oito dias para emendar uma decisão desajustada e extrema. Sabemos que alguns bancos, fruto da sua experiência em situações do género, também estranharam a medida inicial e pediram esclarecimentos à Procuradoria. Os danos causados à TACV são do conhecimento público e foram amplificados por um aproveitamento inqualificável da situação. Vamos ver se podemos fazer alguma coisa para a TACV ser ressarcida pelos prejuízos que lhe foram injustamente causados.
Já agora: porque a TACV recusou acatar a decisão dos tribunais em relação ao piloto em desavença com a Companhia?
É preciso esclarecer que, com base no relatório da ocorrência elaborado na sequência da recusa do Comandante Fontes de fazer o voo, deixando os passageiros em terra, foi-lhe instaurado um processo disciplinar. A Administração aceitou a recomendação de despedimento por justa causa feita pelo instrutor do processo. O arguido, porém, interpôs uma providência cautelar, pedindo a suspensão do despedimento até ao julgamento do processo principal, que está marcado para o próximo dia 14 de Julho. O Tribunal acolheu a pretensão do arguido e mandou reintegrar o Comandante Fontes até ao julgamento definitivo da causa.
O que não foi feito. Quais os fundamentos?
A TACV não acatou a decisão de reintegração, por duas razões fundamentais: a profunda e legítima perda de confiança no seu colaborador, em razão da gravidade do acto praticado (convém referir que o mesmo não conseguiu apresentar um atestado médico que seja para justificar que se encontrava doente) e, depois, porque, como diz a lei e é comum nestes casos, o congelamento das contas só poder ir até ao limite do valor a ser protegido e nunca o que fez a Procuradoria da Comarca da Praia. Ninguém na TACV acreditou que o Comandante Fontes era capaz de cumprir com a ameaça de deixar o avião no chão se a sua família não embarcasse. A sua atitude é um facto inédito na história da TACV, tendo recebido desaprovação generalizada e veemente. E deve-se registar que o homem já tinha antecedente disciplinar grave e foi perdoado.
Podia explicar para os leitores os meandros desse processo. Parece ter havido uma certa negligência no enquadramento jurídico do caso.
Pouco mais há a acrescentar. Somente que o caso foi aproveitado como meio de pressão e chantagem e como mais uma oportunidade para o julgamento e crucificação pública da Administração, em particular do PCA. Compreende-se que assim tivesse acontecido se se tiver em conta o Gabinete de Advogados assistente do Comandante Fontes e o Jornal que noticiou o caso em primeira-mão.
NOVO REGIME DE TRABALHO
Qual é a relação entre a Administração e os pilotos?
Temos grandes e bons profissionais no seio do pessoal navegante, que é, como se compreende, fundamental na produção da companhia. Muitos dos ganhos e resultados que tivemos nos dois últimos anos são creditados a uma produção mais regular e eficiente. Teremos de continuar o caminho percorrido até agora e corrigir os aspectos menos conseguidos. O PNT da Boeing compreendeu desde logo as tarefas que devíamos realizar e tem estado à altura dos desafios que temos que vencer. Relativamente ao PNT da ATR, temos mais problemas mas estou confiante que os podemos ultrapassar. O PNC tem globalmente colaborado e participado no esforço de recuperação que é de todos e a todos beneficiará. Agora vamos negociar a implementação do novo regime de trabalho do pessoal móvel de aviação civil. Espero que possam emergir consensos aceitáveis para todas as partes e que resultem em benefícios para a companhia. Esta precisa de estabilizar e consolidar a sua produção e precisa de ter uma produção mais competitiva face à concorrência.
As linhas da Diáspora e do Turismo estão no máximo da sua exploração?
Não podemos estar satisfeitos com o tráfego que temos neste momento. Não só porque ainda há espaço para uma maior produtividade da actual frota mas também porque, como já referi, a dimensão é essencial no negócio de transporte aéreo devido aos custos fixos a que uma companhia aérea está obrigada. O transporte aéreo, por ser uma actividade simultaneamente capital intensiva e mão-de-obra intensiva, requer volumes apreciáveis de recursos financeiros para o aumento de capacidade de transporte de mais passageiros e cargas. O mercado étnico nos é fiel mas temos problemas de conectividade de linhas que nos empobrecem em termos competitivos. Quanto ao segmento turístico, trata-se de um mercado muito exigente em termos de tarifas e em termos de regularidade. Não se trata só de querer mas de poder: ter capacidade e oferecer um bom produto a um preço competitivo.
SONHO
Muitos brasileiros do Nordeste vão aproveitar os voos da TACV para chegar à Copa do Mundo. Porque é que a Companhia não fez voos charters para a África do Sul nesta alta futebolística?
Simplesmente, porque não temos capacidade para o fazer. Não podemos estar a sonhar com o impossível quando temos problemas muito concretos e reais para resolver.
Nas vésperas da época alta na aviação, a TACV decide retirar o Boeing 757-200 “B. Lèza” da circulação. Porquê e o que vai representar esta decisão em termos de perdas?
Quem disse que o “B. Lèza” foi encostado? Há muito tempo que estavam programados trabalhos de interiores do avião e a sua pintura. Só agora foi possível reunir meios financeiros para a realização desses trabalhos e se conseguiu slot para a sua pintura. Sabia que, para substituir as cadeiras de um avião, é preciso autorização da Autoridade Aeronáutica? E que, para pintar um avião, é preciso marcar e encontrar vez numa empresa qualificada e autorizada para o efeito? As coisas não são fáceis nem evidentes na aviação comercial. O B. Leza já está a regressar à linha. Vai oferecer maior conforto e comunidade aos nossos passageiros e vai ser mais eficiente em voo devido à pintura de que foi alvo. Estes trabalhos deviam ter sido feitos há cerca de três anos.
NO CLUB SELECTO
A TACV vai lançar o serviço “Classe Comfort” nas linhas Boston, Fortaleza, Amsterdam e Paris, bem como a Classe Executiva para Las Palmas. Comercialmente, o que isto representa?
Fazêmo-lo para diferenciar as categorias de passageiros e de tarifas numa perspectiva de oferecermos mais alternativas de comodidade e satisfação aos nossos clientes e de melhorar a tarifa média. É uma exigência antiga dos nossos passageiros a que estamos a responder agora.
A TACV acabou de participar, de 6 a 9 de Junho, pela primeira vez, na Assembleia Geral da IATA. O que isso representa para a Companhia e para Cabo Verde?
Representa estarmos no clube mais selecto e no fórum mais qualificado em transporte aéreo do mundo. Significa a concretização de uma aspiração antiga da companhia de estar entre os melhores e de poder beneficiar, por direito próprio, de todos os produtos e facilidades desta Associação. Vamos poder contar com assistência técnica e aconselhamento qualificados da IATA. Vamos poder formar e treinar os nossos colaboradores nos melhores centros de formação em aviação comercial do mundo.
A Administradora Comercial visitou, recentemente, a Guiné Equatorial, um país sem comunidade cabo-verdiana expressiva e sem grandes interesses comerciais para o nosso país. Porquê dessa visita?
Porque está a abrir-se uma janela de cooperação com a companhia nacional da Guiné Equatorial que será benéfica para ambas as partes e que poderá abrir caminho para entendimentos e acordos muito vantajosos para o futuro. Será uma oportunidade para a TACV pôr à disposição da sua congénere a sua experiência e competências acumuladas aos longos dos anos. Será mais uma prova de prestígio da TACV, muito reconhecido e elogiado por todos aqueles que nos conhecem e reconhecem o trabalho que vem sendo feito ao longo dos anos por profissionais sérios e dedicados em diversos sectores da Companhia.
Começou a implementar uma nova política de desenvolvimento dos Recursos Humanos. Quais são os seus eixos principais e o que ela representa para os trabalhadores e para os utentes da vossa Companhia Aérea? 
Na verdade, o Conselho de Administração decidiu seguir o Conselho de Concertação Social, atribuindo o aumento salarial de 1.75% para este ano (há três anos que não era concedido aumento salarial na empresa). Também foi actualizado o tecto do subsídio de turno em 10% e estamos a avaliar como podemos corrigir os subsídios de turno inferiores ao tecto actual. Num outro registo, o Conselho de Administração decidiu abrir as carreiras (há pessoas com carreiras estagnadas há 10, 15 e mais anos) e corrigir as injustiças de que muitos foram alvo nas suas promoções num período de 3 anos. Os objectivos, para além da justiça relativa nas carreiras, são de gerar maior motivação, maior transparência e equidade e de utilizar a avaliação do desempenho como instrumento de promoção e premiação do mérito. Estamos também a dizer que os colaboradores devem participar dos resultados que ajudaram a criar. Esperamos que os custos venham a ser mais do que compensados por uma produtividade e motivação acrescidas dos recursos humanos da empresa.
RESISTÊNCIA AOS INSULTOS
Chega ao fim de dois anos de gestão e, com isso, o fim do seu actual mandato. Quais são os ganhos da sua gestão?
Já foram referidos ao longo desta entrevista. Acrescentaria que estou moderadamente optimista e expectante sobre a possibilidade de realizarmos um excedente de exploração este ano. Isso é absolutamente possível. Se tivermos um bom Verão IATA e não tivermos tantas irregularidades como em 2009, alcançaremos esse objectivo, apesar das expectativas pessimistas geradas pelas recentes medidas económicas e financeiras tomadas nos principais centro emissores de tráfego para Cabo verde e da escalada de preços dos combustíveis. Estou confiante que os trabalhadores da TACV compreendem e assumem essa necessidade e que tudo farão para a realizarmos. E espero que a revisão das taxas e a revisão da lei de protecção de passageiros alavanquem um tal objectivo.
Como se sente neste momento?
Só posso estar satisfeito e confiante no futuro da TACV. E os trabalhadores da TACV devem sentir-se orgulhosos pela obra feita e pelos resultados conseguidos. Os nossos clientes e parceiros sabem que estamos melhores e é por isso que a sua preferência pela TACV vem aumentando.
Ser irmão do actual Primeiro-Ministro facilita ou dificulta o seu trabalho?
Resisto-me bem aos insultos, calúnias e difamações que me são feitos por causa desta condição. Se isto faz aos que se dedicam a isso felizes, que continuem! Tenho força moral e inteligência emocional suficientes para não me deixar abater por causa disso.
O aproximar das Eleições Legislativas é perturbador da gestão da TACV?
Quando se vê o que se passa no Parlamento Nacional e se lê aquilo que os anónimos de serviço escrevem na net, só se pode esperar o pior em períodos pré e eleitorais. Não é só perturbador para a TACV, mas para toda a gente e para o País.
ANAÇÃO-por Domingos Cardoso, Gisela Coelho, Abraão Vicente
http://www.alfa.cv/anacao/index.php?option=com_content&task=view&id=1383&Itemid=2FOTO-EXPRESSO DAS ILHAS

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