terça-feira, 13 de setembro de 2011

Discurso de investidura do quarto Presidente de Cabo Verde



"Caros concidadãos"

No momento em que inicio funções como Presidente da República, quero saudar todos os meus concidadãos, no país e na diáspora, os que votaram em mim e os que não o fizeram.

A todos quero reafirmar o que disse ao longo da campanha eleitoral: serei o Presidente de todos os cabo-verdianos e a todos valorizarei como cidadãos dignos desta terra, que precisa do concurso de todos, de todos, sem excepção.

Cumprirei as minhas funções como Presidente no estrito respeito pelo que estatui a Constituição da República, que considero como o meu Caderno de Encargos, como é a vontade maioritariamente expressa nas urnas pelos cidadãos cabo-verdianos.
O Manifesto Eleitoral e o Pacto com a Nação que apresentei ao eleitorado, e que mereceram a confiança dos eleitores, são para cumprir. E por isso, quero reafirmar solenemente perante esta Assembleia e perante todos os que me escutam neste momento, o meu firme engajamento com cada um dos compromissos eleitorais que assumí com o povo cabo-verdiano.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional

Agradeço as palavras que me dirigiu nesta que é a Casa da Democracia cabo-verdiana. Aqui é a residência permanente e mais visível do pluralismo político e da democracia no nosso país.

É nesta augusta e simbólica instituição que está representado o nosso povo soberano. Por isso, também aos Senhores deputados dirijo uma palavra especial nesta que é a primeira vez que uso da palavra enquanto Presidente da República: a todos e a cada um de vós a quem os cabo-verdianos confiaram um mandato de representação política, quero assegurar todo o meu respeito institucional e a garantia de total cooperação entre o órgão de soberania que integram e o Presidente da República.

Ao senhor Primeiro-ministro e ao Governo reafirmo o que expressei antes e durante a campanha eleitoral. Vossas Excelências podem contar com o meu firme envolvimento na resolução dos grandes problemas que o país enfrenta e com toda a colaboração institucional que a Constituição possibilita e o país precisa. O Governo terá em mim um interlocutor atento, aberto, disponível, que acompanhará de forma permanente o processo e os resultados da governação.

Serei o árbitro do sistema de poderes e farei tudo o que estiver ao meu alcance para moderar as tensões da vida política, actuando como factor de equilíbrio do nosso sistema de governação, como o exige a Constituição da República.

Só não farei os impossíveis ou o que for rejeitado pelos superiores interesses nacionais, sempre norteado e balizado pela Constituição, valendo aqui a singela ideia, que me tem sido muito cara, de que nos estados constitucionais não há democracia nem estado de direito fora da Constituição e muito menos contra ela.
Os partidos políticos, verdadeiros esteios do nosso sistema democrático, terão no Presidente da República um elemento de incentivo na sua decisiva missão de formadores da vontade política plural dos cidadãos e de mobilizadores das energias necessárias à realização dos objectivos nacionais. Igualmente serão estimulados a, sem abdicarem da sua identidade político-ideológica, construir, quando necessário, os consensos reclamados pelos processos de desenvolvimento e de aprofundamento e extensão da nossa democracia. A estrita equidistância em relação às diferentes forças políticas será um verdadeiro diapasão de toda a intervenção do Chefe de Estado.

As organizações sindicais, patronais ou profissionais, emanações naturais das diversas actividades da sociedade, merecerão a melhor atenção do Presidente que também manterá diálogo permanente com a sociedade civil organizada e com os cidadãos residentes nas ilhas e na diáspora, com destaque para esse segmento da população, prenhe de sonhos, desafios e entusiasmo que é a Juventude cabo-verdiana.

Pela sua especificidade, muito particularmente pela sua grande proximidade relativamente às pessoas e comunidades, e pelo seu potencial de aprofundamento e alargamento da democracia, o poder local democrático será interlocutor muito privilegiado do Presidente que, sempre que necessário e desejável, será o intermediário entre ele e o poder central, contribuindo para que o relacionamento seja saudável e baseado em critérios de justiça, legalidade, respeito mútuo, não-discriminação e para que tenhamos no nosso país um poder local cada vez mais autêntico, democrático e autónomo, ao serviço das populações.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional


Senhoras e Senhores Deputados


Ilustres Convidados

Há momentos que atravessam a vida das Nações, diríamos a definem. Momentos em que todas as energias confluem para uma única causa, um objectivo, um grande desígnio.
Na história recente do nosso país, a Independência foi um desses momentos, quando a Nação cabo-verdiana se levantou em uníssono para resgatar a sua identidade, assumir a sua autonomia enquanto Comunidade e reclamar a soberania sobre estas ilhas.

Quinze anos depois, o segundo grande momento galvanizou a Nação cabo-verdiana, originando num movimento político e social imparável em prol da liberdade e da democracia, que se concretizou com as primeiras eleições pluralistas de 13 de Janeiro de 1991.

Foram dois momentos paradigmáticos, dois momentos de que todos os cabo-verdianos podem justamente orgulhar-se. Foram momentos de ruptura, conseguidos sem traumatismos excessivos, com a dignidade e a perseverança que nos caracterizam como povo.

Ao longo destes trinta e seis anos de Independência, os cabo-verdianos enfrentaram e venceram inúmeros e complexos desafios. E estou seguro de que continuará na mesma senda.
Excelências,
Não constituirá surpresa para ninguém afirmar que Cabo Verde tem pela frente momentos difíceis, que, aliás, já estão presentes no dia-a-dia dos cidadãos. Tempos difíceis que não nos devem desencorajar. Pelo contrário, é nos momentos de grande dificuldade que a alma e a garra da Nação devem sobrepor-se aos obstáculos.

Soubemos, enquanto Nação, levar de vencida enormes desafios que herdámos no momento da nossa Independência.

Soubemos fazê-lo no passado e saberemos dar a resposta adequada aos desafios presentes e futuros.

Os desafios actuais são de ordem diferente dos que tivemos que vencer quando acedemos à Independência. Por isso, as soluções têm que ser diferentes e adaptadas ao contexto interno e externo prevalecentes neste momento.

A primeira exigência para que saibamos encontrar soluções aos nossos problemas, situa-se ao nível do diagnóstico. Temos que enfrentar a realidade tal como ela é e não como desejaríamos que fosse. E devemos dar a conhecer essa realidade aos nossos concidadãos para que tenham a consciência exacta da dimensão dos desafios que temos pela frente.
Isso é tão mais necessário quanto só um esforço colectivo de todos nos permitirá ultrapassar e vencer as dificuldades actuais e, ainda mais importante, assegurar no longo prazo um nível de vida digno a todos os cabo-verdianos.
A verdade pode por vezes ser dura, mas é necessário que todos a conheçam. Acredito profundamente que só assim poderemos mobilizar a sabedoria, as competências, a vontade colectiva dos cabo-verdianos, o seu empenho no engrandecimento destas nossas queridas ilhas.

Caros Concidadãos,

A realidade cabo-verdiana actual mostra sinais mistos, com desenvolvimentos positivos e outros negativos. A continuidade do crescimento económico, o desenvolvimento de infra-estruturas físicas, a cobertura sanitária do país, o alargamento da educação, as tecnologias de comunicação e informação, contam-se entre os sinais positivos, sobre os quais é preciso construir.

Os sinais negativos abarcam realidades hoje bem presentes no quotidiano dos cabo-verdianos: o desemprego de uma grande franja da população jovem, a pobreza que ainda afecta um considerável número de cabo-verdianos, níveis de insegurança que ultrapassam o comunitariamente suportável, os problemas no abastecimento de água e energia na capital e noutros centros urbanos, o endividamento do Estado, das empresas e das famílias, que se aproxima de níveis de alerta, as dificuldades da gestão orçamental, com o défice orçamental a níveis já irrazoáveis, a crise de valores que ameaça corroer o próprio tecido social. O empresariado nacional enfrenta sérias dificuldades. Acrescente-se, ainda, dois problemas cruciais para o desenvolvimento futuro do nosso país: a qualidade insatisfatória global do nosso sistema de ensino e o crescimento insuficiente da produtividade.

Esta realidade nacional insere-se num contexto internacional que assume contornos preocupantes, susceptíveis de influenciar negativamente o desempenho económico do nosso país, altamente dependente dos fluxos financeiros externos e vulnerável às vicissitudes da economia internacional

Excelências, Ilustres Convidados
Nenhum desafio - para além daquele mais geral e verdadeiro prius que se traduz na preservação e reforço dos pilares fundamentais do estado de direito democrático e que se reflecte na afirmação crescente e generalizada de uma cultura democrática - se mostra tão importante e urgente quanto os do crescimento acelerado da riqueza nacional e da redução das desigualdades sociais.

Nos últimos trinta anos, o crescimento real da economia cabo-verdiana foi de 6% ao ano, e o crescimento da riqueza média por habitante foi de 4%, descontando os efeitos do crescimento demográfico. Este resultado pode parecer excelente, mas infelizmente não o suficiente para nos fazer sair efectivamente do subdesenvolvimento. É preciso ir muito além dele, duplicá-lo mesmo, para que as actuais gerações possam ainda beneficiar do desenvolvimento.

A nossa Nação tem a inteligência e a vontade necessárias para vencer o subdesenvolvimento. Afinal, é disso que se trata: vencer o subdesenvolvimento.
Ainda que a palavra subdesenvolvimento gere hoje algumas reticências em favor de outras politicamente mais correctas ou simpáticas, o importante é estarmos todos conscientes de que, quaisquer que tenham sido os nossos sucessos, e tivemos muitos, o que nos resta a fazer para atingir o tão almejado desenvolvimento é tão importante, quiçá mais difícil, mas seguramente ao nosso alcance.

As dificuldades não nos metem medo. Sabemos que a fasquia deve ser colocada bem alto.
Outros povos fizeram o mesmo, colocando-a bem alto, e foram capazes de percorrer, nos últimos quarenta anos do século vinte, o caminho estreito que conduz ao desenvolvimento.
Tiveram a sabedoria de conceber e executar as políticas certas nos momentos certos; souberam aproveitar da melhor forma as oportunidades que as vicissitudes da economia mundial, e a sorte, colocaram no seu trajecto.

Cabo Verde está bem colocado para ser um dos países com capacidade para vencer o subdesenvolvimento na primeira metade do século vinte e um. E esse seria, digo será o terceiro grande momento definidor da nossa história recente.

Quando, orgulhosamente, pudermos afirmar perante nós mesmos e o mundo, que o nosso país venceu a miséria e que nenhum cabo-verdiano vive desamparado na sua terra; quando formos capazes de oferecer oportunidades de emprego a todos os que queiram trabalhar; quando tivermos reduzido as desigualdades para níveis aceitáveis, então nessa altura teremos cumprido a nossa missão para com as gerações presentes e futuras.
Alguns dirão que são sonhos irrealizáveis.
Estamos habituados a esse discurso derrotista. Ouvimo-lo durante a luta pela Independência, considerada um objectivo irrealista e irrealizável. Provámos que os derrotistas estavam errados. Voltámos a escutar as mesmas vozes em relação ao objectivo democracia e liberdade. Respondemos instalando em Cabo Verde um regime democrático estável de que nos podemos orgulhar, apesar de sua incompletude cultural e institucional.

Teremos de responder, e responderemos seguramente da mesma maneira, aos dois grandes desafios do desenvolvimento: o crescimento acelerado da economia e da riqueza nacional, e a diminuição das desigualdades sociais irrazoáveis.

Estes são desígnios nacionais que nos interpelam a todos, governantes, famílias, mundo empresarial e sindical, organizações da sociedade civil, cidadãos.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional


Minhas Senhoras e meus senhores
A afirmação e credibilidade na cena internacional de um pequeno país como Cabo Verde é tributária da definição e execução de uma política externa que tenha em consideração os grandes valores universais, que também são nossos. A nossa acção diplomática deve pois afirmar-se nos valores humanistas, de defesa e promoção da democracia, da liberdade, do respeito pelos direitos humanos, e na observância do direito internacional que pauta as relações entre Estados.

Enquanto Presidente da República e no quadro constitucional existente promoverei e apoiarei o Governo no fortalecimento e desenvolvimento das relações existentes entre Cabo Verde e os seus principais parceiros de desenvolvimento, bem como na busca de novos entendimentos e parcerias, designadamente com os chamados países emergentes.

Saúdo os Governos de países amigos e as organizações internacionais que desde a Independência têm dado um contributo notável ao desenvolvimento do País, o que nos permitiu atingir um patamar de desenvolvimento apreciável, tendo em conta os nossos condicionalismos.

Manifesto a minha disponibilidade para a continuação de uma política de boa vizinhança e de promoção das relações com os países africanos e com as instâncias regionais de que fazemos parte. Deveremos estar sempre de «corpo inteiro», assumindo os nossos valores e os nossos princípios. Deveremos trabalhar para que se afirme uma África do futuro onde triunfem, de forma generalizada, a liberdade, a democracia, o respeito pelos direitos humanos e o bem-estar para todos.

Contribuirei de forma activa para que as relações entre os países da CPLP se fortaleçam e desenvolvam e para que a nossa Comunidade possa ser cada vez mais uma instituição em que os nossos concidadãos se possam rever. Mais uma comunidade de povos do que uma comunidade de Estados.

Darei atenção às relações com os países do continente europeu, em particular os da União Europeia no quadro da parceria especial, procurando maximizar as potencialidades por ela oferecidas.

As relações com os Estados Unidos da América devem constituir um vector importante da nossa política externa, inclusivamente por albergarem a maior comunidade cabo-verdiana no exterior de Cabo Verde. Os valores constitutivos desse grande país, a liberdade individual, a democracia, o respeito pelos direitos dos cidadãos, são também os nossos, e dele comungamos.

A China é hoje um parceiro incontornável de Cabo Verde. Sempre reconhecemos a unidade da China e entendemos desenvolver ao máximo as relações de parceria com esse país, cujo peso internacional crescente reflecte a realidade do seu potencial económico. Entendo que o aprofundamento das relações com a China é de grande interesse para o nosso país, e trabalharei com o Governo para que essa parceria produza os seus frutos no interesse de ambos os países.

Promoverei, no quadro constitucional e no respeito estrito da legalidade, acções oportunas e pertinentes para um eficaz combate à criminalidade internacional organizada, nomeadamente, ao terrorismo e na luta contra o tráfico de drogas. Os parceiros internacionais poderão contar com a nossa disponibilidade e todo o nosso empenhamento para a criação de um clima de paz e estabilidade regional.
Senhor Presidente da Assembleia Nacional


Senhoras e Senhores Deputados

O crescimento acelerado da economia é a pedra de toque, o objectivo intermédio que determinará a nossa habilidade em vencer o subdesenvolvimento.

Na verdade, a característica comum de todos os países que no século passado venceram o subdesenvolvimento, e dos que neste século perseguem o mesmo objectivo, é o facto de terem sido bem-sucedidos em fazer a economia crescer de forma acelerada durante algumas décadas seguidas, num processo interactivo que lhes permitiu melhorar o nível de vida e o bem-estar das suas populações, afinal o grande objectivo do desenvolvimento.

Cabo Verde pode e deve seguir o exemplo desses países.

Simples de dizer, difícil de fazer, dirão alguns.

Comungo desta preocupação, retirando-lhe apenas a carga pessimista.

É verdade que os casos de sucesso ocorreram em contextos internacionais diferentes, em circunstâncias diferentes das actuais.

Também é verdade que a situação internacional não deixa margem para grandes optimismos. A economia mundial pode estar a aproximar-se de novo de um período de recessão, o que nada de positivo nos traz enquanto país aberto e vulnerável a choques externos.

Mas os tempos de crise podem ser momentos de grandes oportunidades. Os países que realizaram o seu “milagre económico”, não viveram apenas períodos dourados. Conheceram momentos de grandes dificuldades no seu caminho para o desenvolvimento. O que os distinguiu e distingue foi e é a sua capacidade, em momentos de crise, de adaptação ao contexto, de adaptação “prospectiva”, de antecipação dos desenvolvimentos do contexto internacional, definição de desígnios estratégicos, e execução de políticas coerentes.

Estes países apostaram na aceleração do crescimento da produtividade nacional, o factor determinante do crescimento económico a longo prazo. Incentivaram a poupança nacional e investiram em infra-estruturas físicas, investiram em tecnologia e inovação, e acima de tudo apostaram no capital humano, desenvolvendo sistema educativos altamente eficientes e de excelência, da base ao topo.
É esse o caminho que devemos trilhar, concedendo a merecida atenção também às questões ambientais e energéticas.

Minhas Senhoras e meus Senhores,


Ilustres Convidados
Cabo Verde continua a ser um país de grandes desigualdades sociais. Os últimos números oficiais relativos às desigualdades, datados do ano 2007, apontam para um coeficiente de Gini de 0,47, um dos indicadores utilizados para medir a desigualdade de rendimentos, o que nos coloca no grupo dos países com maior desigualdade de rendimento, de entre uma listagem de 162 países publicada pela ONU em 2009.

É certo que se registou uma evolução positiva na última década, mas o nível actual de desigualdade dos rendimentos ainda não é comunitariamente aceitável, ele é visto como socialmente irrazoável. O crescimento económico não significa, necessariamente, mais desigualdade. Pelo contrário, uma distribuição mais equitativa da riqueza pode ser um factor de aceleração do crescimento económico.

Por uma questão de eficácia, mas também por razões de ordem moral, temos que combater a miséria ao mesmo tempo que a economia acelera.

O que significa que podem mostrar-se necessárias políticas activas com o mesmo objectivo, direccionadas especificamente para a redução das desigualdades mediante a elevação do estatuto dos que estão, digamos de forma singela, no fundo da tabela. Não devemos ter medo das palavras. É preciso criar riqueza e ao mesmo tempo distribuir riqueza pela via de políticas de elevação das condições de vida dos mais fracos.

A nossa sociedade deve assegurar a todos um nível de rendimento e condições de vida decentes, susceptíveis de proporcionar o livre desenvolvimento da personalidade de cada um, dando, assim, corpo à elementar noção de dignidade da pessoa humana que confere, a final, fundamento ao estado de direito. A pobreza e as desigualdades extremas, pondo em risco a coesão social, podem corroer a nossa unidade como povo.

Ao fim e ao cabo, o que dizemos nada mais é do que efectivamente realizar o estado de direito e de democracia de cariz social, tal como vem desenhado e postulado pela Constituição fundante da II República em que vivemos.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional


Senhoras e Senhores Deputados
Vivemos hoje, a nível mundial, uma das maiores crises económicas e financeiras dos tempos modernos.
Estamos, como todo o mundo, imersos neste grande turbilhão da primeira grande crise da globalização com os efeitos devastadores que está a provocar sobre o emprego, os rendimentos e as restrições orçamentais de muitos dos países, nossos principais parceiros.

Vivemos também, num mundo cada vez mais plano, sem limites e sem fronteiras. Para o bem e para o mal.
É exigido a todos os países uma nova dinâmica reformista, uma nova forma de olhar para o mercado, o Estado e as forças endógenas, um novo papel para a competitividade e a produtividade das empresas e um enfoque na qualificação dos recursos humanos, no seu bem-estar e no seu capital social.
O futuro está nas nossas mãos e depende do nosso esforço e do nosso empenhamento.

Cabo Verde tem que se adaptar aos novos tempos. E essa adaptação às exigências do nosso tempo passa por uma sociedade civil cada vez mais forte, dinâmica, autónoma, responsável e ciente da sua relevância. Capaz de se revelar como instância de fiscalização dos poderes, todos os poderes, mas igualmente como produtora de fluxos de ideias para o interior do Estado. Precisamos que a política e as instituições públicas ajudem a este desiderato global, ainda que não sejam totalmente decisivas.

É preciso desenvolver na sociedade cabo-verdiana uma atitude competitiva por oposição à mera procura de rendas económicas ou da protecção do Estado. O trabalho, a responsabilidade, o mérito, o esforço, a cultura da transparência e do rigor na gestão da coisa pública, a qualidade, a produtividade e a competitividade são valores que merecem ser promovidos quotidianamente.

As empresas nacionais têm que se envolver no desafio que consiste em aproveitar as oportunidades que um mundo global comporta.

Cabo Verde tem de ser uma plataforma atractiva de investimento dos cabo-verdianos, residentes e na diáspora, atractiva para o capital externo em busca de oportunidades de investimento.

O segredo reside no papel desempenhado pelo ambiente económico, pelas instituições e pelas políticas nacionais. São os atributos de uma nação que estimulam as suas vantagens competitivas.

Por isso, a necessidade da promoção de uma classe empresarial nacional forte, competitiva, exportadora e com capacidade para se internacionalizar.


Mas a economia hoje não é só empresas e mercados. É acima de tudo vivência, sociedade, mobilização, partilha e satisfação das pessoas. O mercado passou a ter uma dimensão institucional verdadeiramente nova. Precisamos de promover todas essas dimensões em Cabo Verde e sobretudo o capital social como condição essencial para o desenvolvimento.

Temos de nos diferenciar pela qualidade dos bens e serviços oferecidos, através de uma verdadeira política de certificação internacional.

Essa exigência obriga a uma maior preparação académica, científica e tecnológica dos nossos recursos humanos e das empresas e sobretudo uma grande competitividade do nosso sistema de ensino e formação profissional e de aprendizagem ao longo da vida.

Exige também uma nova cultura empresarial sustentada na inovação, na competência e no empreendedorismo e uma administração pública ágil, despartidarizada e com espírito de missão.

As universidades têm de ser capazes e devem ser incentivadas a abrir a suas portas às empresas e às organizações públicas e privadas para que o conhecimento possa ser a chave de mudança que Cabo Verde exige e que permite aumentar a competitividade e a geração de riqueza.

É nas universidades e nas escolas que se encontra a maior reserva de conhecimento. Delas depende o aproveitamento da nossa oportunidade demográfica.

Um dos maiores desafios de futuro para Cabo Verde é o da construção do sistema educativo e de um ensino superior de alta qualidade, exigente e em linha com elevados padrões.

Temos de saber fazer despertar toda a sociedade cabo-verdiana e os poderes públicos para a importância decisiva da aposta na excelência e no rigor do nosso sistema de educação.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional


Senhoras e Senhores Deputados

Metade da população cabo-verdiana tem menos de 22 anos. Um em cada três habitantes tem menos de 15 anos e dois em cada três cidadãos tem menos de 30 anos. Bastam estes números para revelar a extrema juventude da população cabo-verdiana, e a enorme responsabilidade que pesa sobre os governantes do país. Os desafios que se colocam aos governantes na sua relação com a juventude não se situam apenas ao nível da satisfação de necessidades como a educação de alto nível, ocupação de tempos livres, saúde para todos, habitação condigna, emprego, segurança e igualdade de oportunidades na vida para os jovens. Não, a responsabilidade dos governantes vai mais longe, entra pela esfera de valores. O valor da vida humana, a liberdade, a tolerância, a aceitação da diferença, a paz social, o respeito pelos direitos dos outros, a honestidade, o trabalho sério, a realização pelo trabalho, a responsabilidade social, a igualdade de oportunidades, a autonomia da pessoa humana. Este combate pelos valores que devem reger a nossa sociedade é o mais delicado, o mais difícil no nosso mundo globalizado.

Crente e confiante no valor e no papel da juventude cabo-verdiana para o futuro de Cabo Verde, os jovens terão no seu Presidente da República alguém que lhes fala a verdade e que, não se escondendo atrás do cargo que ocupa, promoverá a cultura do mérito e da qualidade, incentivará a igualdade de oportunidades, respeitará a «diversidade das juventudes» e dinamizará iniciativas e programas conducentes ao despontar do conhecimento e da criatividade nas várias áreas do saber e da cultura.

Permitam-me que apele a que levem o vosso país a tocar os céus, se possível! Sereis vós a poder construir um Cabo Verde mais livre, mais justo e solidário porque mais desenvolvido e democrático.

Mais do que ser o país a desafiar-nos, a desafiar-vos, devereis ser vós a interessar-se pelo futuro e a conquistá-lo.

Excelências,

Nos tempos em que vivemos – também de evidente crise dos valores positivos tradicionais de Cabo Verde, da solidariedade, da tolerância, da responsabilidade, do respeito pelos mais idosos, do brio profissional, da honestidade – uma política activa de família como espaço privilegiado de realização da pessoa humana mostra-se inadiável. Ela é ou deve ser o elemento agregador fundamental na sociedade cabo-verdiana.

Minhas senhoras e Meus senhores,

No estrito âmbito dos poderes constitucionais que cabem ao Presidente da República, irei prestar significativa atenção ao sistema da Justiça e seu efectivo e eficaz funcionamento, contribuindo para que possa retomar níveis mais razoáveis de credibilidade aos olhos dos cidadãos.

Sem decisões reconhecidamente justas, sem uma justiça que gere confiança na comunidade, com a celeridade desejável e adequada à afirmação de outros valores que o sistema também deve proteger e afirmar, e acessível aos cidadãos, a coesão social e o sistema de crenças no ideário democrático ficam abalados. Sistema de justiça adequado e credível e eleições livres e transparentes são, decisivamente, elementos estruturantes do regime de democracia.

A Justiça tem que ser um exemplo de rigor, de credibilidade e de transparência. Os tribunais têm que ser, sem sombra de dúvida, factores de promoção de uma sociedade de Justiça. O acesso à justiça tem que ser melhorado e garantido a todos os cidadãos, que não podem ficar eternamente à espera das decisões dos tribunais.

 questão da morosidade da Justiça é central no nosso sistema judicial, estando ela ligada a uma complexa e diversificada teia de factores já devidamente recortada e estudada. Sem preocupação de minúcias descabidas neste momento, questões como uma maior capacitação técnica de todos os agentes da justiça, criação de verdadeiros e autónomos serviços de inspecção, enfim, mecanismos de responsabilização do sistema no seu todo que, naturalmente, não se confundam com preterição de princípios basilares do estado de direito como os da independência do poder judicial e dos juízes, da irresponsabilidade destes pelo teor de suas decisões e da autonomia do Ministério Público, deverão ser enfrentadas com coragem política, mesmo que tenham de ser vencidas eventuais e desajustadas resistências corporativas.

Mas a este nível, é também preciso encontrar as soluções e os compromissos políticos que permitam que se realize a Constituição, no que à instalação do Tribunal Constitucional e ao Provedor de Justiça diz respeito. Não é uma prática desejável nem exemplar que exigências constitucionais tão precisas estiolem com atitudes omissivas ou de indiferença de poderes e responsáveis políticos, a quem cabe, em primeira linha, a tarefa de respeitar e fazer respeitar a Constituição e de a realizar com efectividade. De mais a mais, trata-se de instituições fundamentais no nosso Estado de Direito Democrático, seja, num caso, para a afirmação incondicionada de um cultura constitucional no país, tão vital para a cultura democrática, seja, no outro caso, para a defesa de direitos fundamentais e a afirmação da cidadania democrática.

Comprometo-me a trabalhar, com empenho, para que rapidamente os agentes políticos envolvidos cheguem aos consensos necessários a uma efectiva instalação daquelas instituições.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional,

O desenvolvimento sócio-económico é um imperativo nacional, mas ele apenas será atingido na sua plenitude de significados se for harmonioso e equilibrado de uma perspectiva de sua extensão a todas as parcelas do território nacional. Igualmente ele não será atingido se não for concebido e balizado no quadro da preservação, desenvolvimento e aprofundamento da nossa já rica e diversificada cultura, autêntico retrato da alma cabo-verdiana em permanente (re) construção.

A cultura cabo-verdiana é o verdadeiro esteio da nossa identidade nacional – rica e plural na sua génese e na constante redefinição de seus contornos externos e intrínsecos -, nossa âncora nos processos marcantes da nossa história colectiva e cimento que une ilhas e continentes, cinco de Julho e 13 de Janeiro, conferindo à nação uma dimensão que extravasa a esfera territorial.

Acarinharei e apoiarei, nos limites de minhas atribuições e capacidades, essa plêiade de mulheres e homens que, na transcendência de sua criatividade, recria incessantemente as emoções e o espírito crioulo nosso. Procurarei contribuir para que a nossa cultura e, em particular, os agentes e produtores de cultura, tenham o reconhecimento merecido no país e no estrangeiro e as condições para um cabal desenvolvimento de sua actividade musical, artística e literária.

Este é também o momento de lembrar com vigor, com agradecimento, o papel de extrema importância que a diáspora cabo-verdiana tem desempenhado no desenvolvimento de Cabo Verde e na consolidação da nossa democracia. A todos os cabo-verdianos residentes no exterior, a cada homem cabo-verdiano, a cada mulher cabo-verdiana espalhados pelo mundo envio as minhas saudações fraternais como Presidente da República de Cabo Verde e auspicio um breve regresso à terra mãe para matar saudades.

A parcela da nação cabo-verdiana residente fora do país estará sempre no centro das atenções do Presidente da República, traduzidas primeiramente no reforço do seu sentimento de pertença a esta Nação, através do estímulo a acções que tenham em vista o recorte da identidade cultural e a ampliação da participação política. A integração nos países de acolhimento será igualmente uma das prioridades no âmbito das competências do Presidente da República enquanto mais alto representante da Nação cabo-verdiana. Tudo farei nessa direcção, concedendo uma atenção particular a comunidades residentes em alguns países e que se encontram em situação especialmente precária.

Uma adequada inserção dos recursos culturais, científicos, tecnológicos, financeiros e empresariais dos cabo-verdianos residentes no estrangeiro no processo de desenvolvimento de Cabo Verde será uma das minhas preocupações permanentes.

Aos nossos excelentíssimos convidados, representantes de Estados Amigos que honraram esta cerimónia com a sua presença quero, em nome do povo cabo-verdiano, expressar o meu reconhecimento e gratidão. Como Chefe de Estado farei uso de todas as faculdades constitucionais que me são conferidas para promover, de forma intensa, activa e digna, a aproximação entre os nossos povos. Estarei disponível para, no quadro das nossas relações entre Estados, garantir que o diálogo, o entendimento e os valores comuns da democracia e do respeito mútuo prevaleçam sempre. Mais uma vez meus sinceros agradecimentos pela vossa respeitável presença
Excelências,
Gostaria de saudar, com respeito, o Presidente cessante Comandante Pedro Verona Rodrigues Pires e agradecer o contributo que, na Presidência da República, deu para a afirmação de Cabo Verde no mundo. Desejo-lhe e à Excelentíssima Esposa as maiores felicidades na vida pessoal e familiar.

Ao Dr. Mascarenhas Monteiro, primeiro Presidente eleito democraticamente em Cabo verde, as minhas mais vivas e respeitosas saudações, desejando-lhe, bem assim à Excelentíssima Esposa, as maiores felicidades.

Ao Presidente Aristides Pereira, os meus cumprimentos igualmente respeitosos, extensivos à Excelentíssima família, e os votos de rápidas melhoras.

Seja-me permitido, num acto solene como este, exprimir ainda mais alguns sentimentos pessoais. Abrir o coração e dizer alguma coisa do que me vai dentro.

É na energia que emana do corpo e da alma dos que no dia- a -dia constroem Cabo Verde e que, nas memoráveis jornadas democráticas de Agosto, assumiu expressão ímpar, que busco forças para colocar todo o meu ser ao serviço do país.

Quero continuar a fazer parte desse caudal quase indomável que é a proverbial tenacidade do Povo destas ilhas e contribuir para que cada vez mais ela se transforme de facto num instrumento de mudanças profundas nas condições de vida de todos os cabo-verdianos.

Queria, outrossim, agradecer aos muitos milhares de cabo-verdianos anónimos, nas ilhas e na diáspora, que quiseram que hoje prestasse este juramento perante a Nação. Em especial a todos quantos, de forma abnegada, colaboraram de perto comigo na grande aventura democrática que acaba por desembocar igualmente nesta cerimónia singela mas memorável. Destaco a minha família que nunca me regateou o apoio e o amparo necessários.

Muito obrigado a todos!

Enfim, permitam-me evocar a memória de meu pai, que seguramente, em silêncio mas de forma inteligente, contribuiu para que este evento tivesse tido lugar hoje.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional, Minhas Senhoras e meus Senhores,

Estamos cientes de que a grandeza nunca é um dado adquirido. Deve ser conquistada. A nossa viagem como povo nunca foi feita de atalhos ou de aceitar o mínimo. Não tem sido o caminho dos que hesitam, pelo contrário, tem sido o dos que correm riscos, os que agem, os que fazem as coisas. Temos sido um povo que muda constantemente a sua condição e reescreve o seu destino por actos de sabedoria, coragem e perseverança. Estas ilhas viram a chegada dos primeiros colonos, a chegada dos primeiros escravos. Juntos vencemos a escravatura, derrubámos o colonialismo e promovemos com sucesso um regime baseado na liberdade e no respeito pelos direitos humanos.

Por todas estas razões acredito que nós como povo venceremos os desafios do futuro, juntos seremos capazes de ganhar novos horizontes, novas perspectivas e oferecer aos nossos descendentes um Cabo Verde mais livre, mais desenvolvido, mais humano e que nos possa orgulhar a todos.

Muito obrigado".

Jorge Carlos Almeida Fonseca
Assembleia, Nacional, 9 de Setembro de 2011

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