A
língua traduz de tal forma a profundeza das relações que as
pessoas estabelecem entre si, com o seu meio, a sua história, a sua
vida, que, mesmo quando resulta da apropriação ou empréstimo de
línguas alheias, ela é moldada, recriada, impregnada pelo espírito
do utilizador.
Hoje
celebramos a nossa língua materna, essa forma de comunicação, de
criação que ao longo de séculos temos edificado a partir de
contribuições de culturas diversas e da nossa vivência singular,
através da qual nos afirmamos como cabo-verdianos nascidos em Santo
Antão, Fogo, Maio, Senegal, Estados Unidos da América ou Suécia.
É
através dela que nos iniciamos no alfabeto da afectividade, na
aventura da comunicação, que cada um aprende a ser Eu ao mesmo
tempo que se assume como Nós. Talvez, sem ela jamais pudéssemos
sentir sodade, vivenciar morabeza e saber o que é um kretxeu.
'Sodade'
será talvez a mais conhecida do nosso léxico, além-fronteiras. A
nossa música levou consigo a nossa língua, o nosso modo de ser e
uma mensagem de paz, amor e concórdia de ilhéus orgulhosos da sua
história e confiantes no futuro. Na voz de Cesária Évora, do
Canadá ao Japão, da Suécia à África do Sul, milhares de pessoas
descobriram não só os encantos da nossa música, mas também a
forma dos nossos vocábulos, essas palavras estranhas carregadas de
sal, solidão e esperança - expressão da nossa dignidade, graça e
leveza de espírito.
É
bem verdade que foi na nossa língua materna que nos foram contadas
as primeiras histórias envolvendo Lobo & Xibinho, Nha Ti Ganga,
Gongons e demais figuras que preencheram o nosso imaginário
infantil.
A
língua cabo-verdiana é, pois, um dos principais traços de união
entre os cabo-verdianos e a sua promoção, longe de contribuir para
a secundarização da língua portuguesa, que, também, é nossa,
permitirá uma convivência mais adequada entre ambas.
Neste
quadro, a definição de regras claras para a sua escrita será de
grande valia e permitirá a sua utilização no sistema de ensino,
para além das experiências piloto.
Os
estudos e trabalhos de investigação em curso nas diferentes
disciplinas relacionadas com a língua cabo-verdiana têm trazido
contribuições importantes, mas seria desejável que o processo
avançasse para que, num espaço de tempo razoável, pudéssemos ter
a possibilidade de, também, escrevê-la de acordo com normas
adequadas.
No
momento em que um dos mais importantes veículos da nossa língua
materna, a Morna, se candidata ao reconhecimento formal, pela Unesco,
de uma realidade que é a sua universalidade, esta celebração
adquire importância particular.
Acreditamos
que os trabalhos realizados com vista ao reconhecimento da Morna como
Património Imaterial da Humanidade, as investigações sobre a
língua materna em curso e o possível desfecho positivo dessa
candidatura, constituem incentivos muito importantes para a afirmação
da língua cabo-verdiana
As
importantíssimas contribuições para a nossa língua que a
criatividade de Eugénio Tavares, Beleza, Orlando Pantera, Sérgio
Frusoni, de entre outros, nos brindaram são, sem dúvida,
catalisadores fundamentais para que a língua cabo-verdiana seja
elevada ao nível que todos almejamos.
Por:Jorge
Carlos Fonseca
Data:21
de Fevereiro de 2019
Fonte:https://www.facebook.com/Presidencia.cv/
Sem comentários:
Enviar um comentário
Comentar com elegância e com respeito para o próximo.