“Se existe liberdade para viver, por que então não existe liberdade para morrer?”
Decidir por conta própria quando já não se quer mais viver e poder pôr um fim à sua vida. A fundação Uit Vrije Wil (De Espontânea Vontade) acha que maiores de 70 anos podem decidir eles mesmos quando sua vida deve terminar e quer que isso seja transformado em lei. A fundação começou uma iniciativa civil que foi apoiada por 117 mil holandeses. Os parlamentares agora deverão analisar o projeto nas próximas semanas.
A pedido da fundação, quatro mil holandeses enviaram cartas à câmara baixa do parlamento. São cartas com histórias pessoais de idosos que lutam com o fim de sua vida. Petra de Jong, diretora da Associação Holandesa para o Término Voluntário da Vida, ficou impressionada com as cartas enviadas.
“São histórias aflitivas nas quais se percebe que ainda há muito para ser feito. Espero que os parlamentares também percebam isso e venham com uma boa solução para este grupo que agora está totalmente desamparado pela lei”, diz Petra de Jong.
“Tenho 81 anos, sou relativamente saudável, mas se eu ficar mal, quero eu mesma poder decidir se quero ser tratada. Os hospitais representam com frequência muito sofrimento para se ter alguns meses a mais de ‘vida’, então, por favor, deixem-me decidir eu mesma. Afinal, não é a sua, mas a minha vida.”
Lei da eutanásia
A lei atual na Holanda existe há dez anos e permite a eutanásia quando um paciente holandês pede explicitamente por isso. O médico deve seguir regras rigorosas para ajudar alguém a terminar com a própria vida, apenas em casos de sofrimento insuportável, como no caso de doenças incuráveis ou pessoas que têm problemas psicológicos sem esperança de tratamento.
No ano passado, a comissão de avaliação da eutanásia recebeu 2136 pedidos. Com isso, o aumento de pedidos de eutanásia, que vem ocorrendo desde de 2006, continua a crescer. Ainda não está clara a razão para este crescimento.
Na imprensa estrangeira há com frequência histórias negativas sobre a lei da eutanásia. Os holandeses optariam muito rapidamente pelo término da vida. Mas segundo Petra de Jong, isso tem uma dose de hipocrisia.
"A eutanásia acontece no exterior com a mesma frequência que acontece na Holanda, só que acontece em segredo. Eu mesma, como médica, vi a lei ser posta em vigor em 2002. Fiquei extremamente feliz porque a partir daquele momento todo o problema de fazer às escondidas estava acabado, pois podia-se finalmente conversar com um colega a respeito, desde que você se ativesse às normas exigidas”, diz De Jong.
Idosos
Idosos que não têm sofrimento insuportável em consequência de problemas físicos, mas se cansaram de viver, não podem apelar para a lei da eutanásia. A Associação Holandesa para o Término Voluntário da Vida e a fundação Uit Vrije Wil acham que deve haver uma regra específica através da qual idosos possam decidir eles próprios quando querem morrer.
“Como responsável pelos cuidados às minhas agora já falecidas mãe e irmã vi e percebi claramente como as coisas ‘não devem ser’. Também acho que as pessoas têm que ter o direito de decidir elas mesmas quando já viveram o suficiente e têm direito de receber ajuda para isso.”
Médicos
A organização médica KNMG não acha que uma nova regulamentação seja necessária para idosos que se cansaram de viver. No entanto, recentemente esta posição se flexibilizou,
“Quando se trata de idosos com doenças e queixas que, por si só, não trazem risco de vida, elas podem juntas ser consideradas sofrimento insuportável que leva à desesperança e assim se encaixam na lei”, diz Eric van Wijlick, da KNMG.
Desejo de morrer
De acordo com Van Wijlick, os médicos têm dificuldade com os pedidos de eutanásia destes pacientes porque é difícil constatar se um idoso tem sofrimento insuportável. A KNMG está pedindo uma investigação sobre o alcance deste grupo de idosos com desejo de terminar a vida.
Para a KNMG é diferente quando se trata de um idoso que está cansado de viver, mas não tem problemas físicos ou psíquicos. Quando alguém realmente não quer mais viver, então há outras saídas sem que seja preciso recorrer à lei de eutanásia, diz Van Wijlick. “Elas podem parar de comer e beber. Os médicos podem então ajudar dando morfina de maneira que o paciente durma até que a morte chegue. Além disso, um paciente pode decidir que não quer mais ser tratado.”
“Meu pai tinha 73 anos e muita saúde até que foi constatado um câncer de próstata. Nos últimos dez anos de sua vida passou por uma situação indigna de um ser humano. Obter a eutanásia foi uma luta. Mas esta luta nós vencemos. Eu não quero isso. Quero poder decidir o fim da minha vida. Foi muito difícil encontrar um clínico geral que compreendesse a decisão.”
A Associação Holandesa para o Término Voluntário da Vida sabe que um grande número de médicos tem dificuldade em realizar a eutanásia. Por isso a associação quer abrir no ano que vem uma clínica para pacientes que desejem terminar sua vida. Paralelamente a isso a associação avalia a possibilidade de trabalhar com times ambulantes que possam ajudar as pessoas a realizar a eutanásia em suas casas.
* Os textos em itálico são trechos das cartas enviadas por holandeses aos membros do parlamento.
http://www.rnw.nl/portugues/article/holandeses-querem-liberdade-para-morrer
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