Deputada Eva Caldeira Marques: “A TCV está nas mãos do Governo e tem servido como instrumento de propaganda”
Deputada Eva Caldeira Marques
Referindo-se, principalmente à Televisão Pública de Cabo Verde, a deputada Eva Caldeira Marques considera que os órgãos de comunicação públicos continuam ainda demasiado instrumentalizados e ao serviço do poder. Numa entrevista que visava abordar a importância da criação da entidade reguladora da comunicação social, a advogada e representante do Movimento para a Democracia, principal partido de oposição, falou ao Expresso das Ilhas e considerou que a aprovação da lei que estipula essa autoridade poderá diminuir consideravelmente os atropelos à liberdade de imprensa a nível nacional.
Expresso das Ilhas - Como avalia o estado actual da Comunicação Social no país?
Eva Caldeira Marques - Temos uma percepção do que é a Comunicação Social e de quais as suas limitações, principalmente a nível dos órgãos público. Falo da Rádio e Televisão públicas, da Inforpress também. O que nós vemos aqui é uma total instrumentalização, sobretudo, da televisão pública que está nas mãos do nosso executivo e tem servido como instrumento de propaganda das obras do actual executivo governamental.
Porque diz isso? Porque acha que a Televisão está nas mãos do Governo?
Bem, o que nós vemos do que é o serviço informativo da televisão pública, do que é toda a grelha de programação desse órgão é um serviço prestado ao executivo como propaganda da obra feita. Nem sempre a isenção e o rigor jornalístico vêm á superfície. É isso que se vê internamente mas, outra coisa é a percepção do mundo em relação à Comunicação social cabo-verdiana. Há dias ouvi o Primeiro-ministro dizer que a nossa comunicação social está entre as primeiras do mundo e nós sabemos que isso não corresponde à verdade mas, de alguma forma foi feita uma lavagem da imagem da comunicação social - principalmente a pública - lá fora que se formos ver à Wikipedia ou à ‘Freedom House Press Report' que tem um relatório que põe realmente Cabo Verde entre os países com maior liberdade de imprensa. Mais até que muitos países na Europa e mais do que o Brasil que tem a máquina de comunicação que tem. Cá dentro sabemos que isso não corresponde à verdade mas. É essa a imagem que passa.
Como deputada, suponho que tem conversado com os profissionais de comunicação social, os meus pares, sobre esse assunto. O que é que eles lhe têm transmitido?
Principalmente temos contactado os profissionais de rádio e televisão públicas e a esse nível nota-se um descontentamento extremamente grande porque a gestão não funciona ou não tem funcionado no melhor interesse de informar o público cabo-verdiano. Afinal, a Televisão de Cabo Verde recebe um subsídio do Estado para exercer serviço público e os profissionais demonstram que estão altamente descontentes no que concerne à gestão da TCV. Esperamos que este quadro venha a mudar agora com a aprovação da autoridade reguladora da comunicação social que é uma entidade independente do poder executivo, que é nomeada por uma maioria de dois terços dos deputados da Assembleia nacional e portanto, nós garantimos o não aprisionamento a um determinado partido político.
As negociações no Parlamento entre os diferentes partidos políticos sobre este tema têm sido fáceis? Nota-se que há, na generalidade, consenso, ou não?
Algumas questões, infelizmente, não puderam ser negociadas. Por exemplo, nós consideramos que as multas ou coimas para os jornalistas privados que exercem a comunicação social em nome próprio são demasiados elevadas e podem vir a limitar o jornalista que, com medo de incorrer em alguma infracção imaginária, faça auto-censura. As multas estavam inicialmente propostas entre 150 mil escudos e um milhão e quinhentos mil escudos. Para uma pessoa que trabalha em nome pessoal são exorbitantes e podem exercer isso que não queremos que é a auto-critica. Conseguimos baixar para o intervalo entre 100 mil e um milhão de escudos mas, mesmo assim é muito alto mas, não pudemos baixar mais. Por outro lado, insistimos, mas não com seguimos também que o licenciamento dado aos órgãos de comunicação para funcionarem passasse a ser emitido por essa autoridade. Não vai ser. Vão continuar a a ser emitidos pela ANAC que é nomeada pelo executivo governamental e assim, de uma forma ou de outra continuamos a ter uma dependência porque o licenciamento também necessita de ser desgarrado da instrumentalização política.
Neste momento, como avalia o trabalho feito pelos jornalistas nacionais?
Penso que têm sido muito profissionais, dentro das limitações que nós temos e, quando falo em limitações refiro-me principalmente à auto-censura. O jornalista pensa se, resultado de uma matéria ou de uma opinião que expresse, se vai ter vencimento amanhã, se vai ter um sustento mas, mesmo dentro desse quadro, penso que os profissionais tentam fazer o seu trabalho com isenção e com rigor. Mas ainda há muitas outras limitações, nomeadamente na obtenção de informação de que os jornalistas necessitam para fazer o seu trabalho e, por isso, ainda há muito por fazer para atingirmos o patamar de liberdade de imprensa que se propaganda que o país está mas, não está.
Susana Rendall Rocha, Redacção Mindelo
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