LONDRES-Poucos dias antes do pleito, especialistas ainda não arriscam um prognóstico sobre a composição do próximo governo britânico. Fatores de incerteza são o sistema eleitoral e o comportamento dos eleitores.
"A eleição mais emocionante em décadas": é o que se ouve de diversas fontes. O Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte elege em 6 de maio seu novo parlamento. É improvável que o Partido Trabalhista do primeiro-ministro Gordon Brown alcance a maioria desta vez. A campanha dos trabalhistas aposta na experiência do premiê, sobretudo no modo como lidou com a crise econômica.
No entanto, a simpatia por Brown está em baixa – o que não é de espantar, já que ele comete uma gafe atrás da outra. Mas tampouco os oposicionistas conservadores – sob David Cameron, mais jovem e de perfil mais moderno – têm perspectiva de maioria absoluta. Após tantos escândalos sobre despesas e doações, muitos eleitores dos dois grandes partidos estão decepcionados. Com os liberal-democratas liderados por Nick Clegg, um terceiro partido ganhou popularidade e mudou as regras do jogo eleitoral.
Fidelidade a um partido é coisa do passado
Pela primeira vez em décadas existe a possibilidade de um empate no Reino Unido. Os fatos de que agora há três partidos na corrida, em vez dos dois habituais, e de que os partidos menores também veem a chance de conquistar influência por meio de acordos com os maiores, tornam esta eleição especialmente emocionante.
Justin Fisher, professor de Política na Universidade Brunel, em Londres, pesquisou o comportamento eleitoral dos britânicos de 1945 até a última eleição, em 2005. Segundo ele, os eleitores britânicos de hoje em dia não estão mais ligados a um determinado partido: a maioria está também disposta, a curto prazo, a votar em outro grupamento.
Isto explica, em parte, o rápido crescimento de popularidade que os liberal-democratas registraram, desde a aparição do jovem e carismático líder Clegg, no primeiro de três debates de televisão, em 15 de abril último. Desde então, as pesquisas pouco têm variado. Os conservadores têm uma ligeira vantagem, com no máximo 34% das intenções de voto, enquanto os trabalhistas e os liberal-democratas brigam pelo segundo lugar, com 27% a 29%.
Sistema eleitoral britânico: como um torneio de futebol
Mas quão representativas são as pesquisas de intenção de voto no Reino Unido?
Segundo o pesquisador Fisher, elas não dizem muito sobre o provável resultado das eleições, principalmente no que toca à divisão das cadeiras no parlamento. O politólogo profetiza que os liberal-democratas não vão receber tantos votos quanto as pesquisas levam a crer. A razão disto é o sistema político britânico, que não prevê a representação proporcional.
Há 650 distritos eleitorais no Reino Unido e, como explica Fisher, cada um deles é como uma eleição isolada. Cada distrito elege o candidato que vencer por maioria simples. Fisher compara o processo a um jogo de futebol: "Pode se vencer por 1 a 0, 2 a 0 ou 3 a 0, mas sempre há apenas um vencedor e três pontos por partida".
Isto quer dizer que não importa quantos gols sejam marcados – ou que vantagem se alcance num determinado distrito – o que vale é quantos jogos são vencidos ao todo. Um voto para os liberal-democratas num distrito em que não têm chances acaba sendo um voto desperdiçado. Por isto, Fisher acredita que muitos dos eleitores que hoje estão com Clegg e seu partido, mudarão de preferência até o dia da eleição.
Maioria no governo com poucos votos
Este sistema explica também porque o Partido Trabalhista tem, no momento, a maioria das cadeiras no parlamento londrino, embora tenha recebido apenas 35% dos votos na eleição de 2005. Especialistas ressaltam que o partido tem uma distribuição favorável de eleitores pelo país e pode conquistar distritos eleitorais, apesar de um baixo total de votos.
Por este motivo, a eleição vai ser decidida nos cerca de 150 distritos nos quais os dois principais candidatos têm menos de 10% de diferença entre si na preferência dos eleitores. Fisher calcula que, para ter a maioria de apenas um voto em Westminster, os conservadores precisariam de mais 116 cadeiras, o que seria o terceiro maior contingente desde a Segunda Guerra Mundial. Segundo as pesquisas, é improvável que o consigam.
Empate como oportunidade para os pequenos
Caso o empate previsto pela maior parte dos especialistas aconteça, os liberal-democratas poderiam fazer uma coalizão com um dos grandes ou apoiar um governo minoritário com o partido cuja política lhes for mais compatível.
Há porém outros pequenos partidos que esperam ter mais influência no parlamento com esse impasse. Eberhard Bort é professor de Política e Administração Pública na Universidade de Edimburgo (Escócia). Ele acredita que tanto os nacionalistas escoceses (SNP) quanto os nacionalistas galeses do Plaid Cymru podem adquirir, em certas circunstâncias, um papel mais importante do que o atual.
Esses partidos fazem parte do governo em seus países (o SNP compõe um governo minoritário na Escócia e o Plaid Cymru uma coalizão com os trabalhistas no País de Gales), mas na hora de escolher os representantes em Westminster, muitos eleitores preferem votar nos "partidos grandes" por causa do sistema eleitoral, diz o professor Bort.
Para Justin Fisher, a chance de os pequenos participarem de uma barganha pelo governo depende de quão perto trabalhistas ou conservadores estejam de uma maioria. Se faltarem muitas cadeiras, eles precisarão conquistar o apoio dos liberal-democratas. Se faltarem poucas, eles podem dar preferência a um acordo com os partidos menores.
As urnas serão fechadas nesta quinta-feira, 6 de maio, às 22h00 (horário local). Segundo as pesquisas, até o momento, um terço dos eleitores ainda está indeciso, e em alguns desses distritos duvidosos, a diferença entre os concorrentes é muito apertada. Por isto esta eleição britânica será, provavelmente até o encerramento, a mais emocionante em décadas.
RADIO DW-Autora: Irene Quaile (TM)
Revisão: Augusto Valente
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