sexta-feira, 2 de julho de 2010

CV:ENTREVISTA COM MANUEL DE PINA, EDIL DA RIBEIRA GRANDE DE SANTIAGO-por José Sousa Dias

"Futuro da Cidade Velha está no turismo"

CIDADE VELHA-É o primeiro presidente da Câmara da Ribeira Grande de Santiago, conhecida por Cidade Velha, capital de Cabo Verde até 1770. Manuel de Pina fala sobre a cidade, que passou a município em 2005 e que, a 26 de Junho de 2009, fez agora um ano, foi classificada pela UNESCO Património Mundial da Humanidade.
Manuel de Pina fala do potencial turístico da região, apela ao investimento externo e lembra a História de cinco séculos e meio da Ribeira Grande de Santiago, colonizada pelos portugueses em 1462, que descobriram a ilha dois anos antes. Ser Património da Humanidade tem riscos, como a falta de preservação, mas traz também muitas vantagens. Hotéis, circuitos turísticos e cultura. Um projecto integrado, que envolve também a agricultura e pesca, à espera de quem pegue nele para tornar aquela que foi a primeira cidade construída por europeus nos trópicos. Em meados do século XVII, a Ribeira Grande de Santiago tinha, em proporção, mais igrejas que Roma. Cristianizada, foi um dos principais entrepostos do tráfico negreiro de África para as Américas. Foi destruída, reconstruída e novamente destruída, até que a passagem da capital para a então Praia de Santa Maria, actual Cidade da Praia, a fez entrar em declínio. É esse declínio que Manuel de Pina quer contrariar e a arqueologia é parte fundamental no objectivo, pois dela dependerá o turismo, a cultura, a agricultura, a pecuária e a pesca. Quer manter a traça original das pequenas casas de uma porta e duas janelas, criar os museus Nacional e da Escravatura, tudo sustentado na Cultura, ou na Economia da Cultura. A visibilidade é agora grande e os projectos estão a começar a aparecer. Venham mais investidores.
O que é para si ser presidente de câmara de uma cidade como a Ribeira Grande de Santiago, conhecida também por Cidade Velha?
É uma câmara cheia de simbolismo. Para mim é muita responsabilidade e também um motivo de orgulho, pois, afinal de contas, a Cidade Velha é o "berço da nacionalidade cabo-verdiana e é o primeiro sítio de Cabo Verde classificado como Património Mundial da Humanidade e, portanto, estou mesmo contente por ter essa oportunidade. Ainda mais por ser o primeiro presidente da Câmara, criada administrativamente em 2005.
Como via a Cidade Velha antes de 2005?
Com muita perspectiva e como uma cidade com futuro. Pela sua importância histórica, pela sua localização e beleza, e ainda pela beleza que tem, pelos pontos de interesse que tem, sempre a vi com muito futuro.
... com potencial?
Com muito, muito, potencial, em vários sectores. Turismo, agricultura, pecuária, pesca, é um município com muitas potencialidades.
Como encontrou a cidade em 2005?
Encontrei alguns projectos em curso e também muitas dificuldades. O município, apesar das potencialidades que tem, tinha um índice de desenvolvimento muito baixo. Até 2005, a Ribeira Grande de Santiago estava subordinada ao município da Praia e isso dificultou muito o desenvolvimento do município em si. Era um município muito carente, com falta de praticamente de tudo. Ainda falta muita coisa, mas as perspectivas são boas para entrar na rota do desenvolvimento.
O que trouxe o título de Património Mundial da Humanidade ao município?
Primeiro deu uma projecção internacional à Cidade Velha e, por inerência, a Cabo Verde. Muitas portas se abriram, as perspectivas são boas, a cooperação internacional já se mostra mais disponível connosco e as oportunidades estão a aumentar. Tudo isso tem posto a Cidade Velha num patamar muito elevado.
As escavações arqueológicas têm demonstrado que a Ribeira Grande de Santiago do passado é muito diferente da que hoje existe. O que se pode fazer para, primeiro, se continuar com as escavações e, depois, para se preservar esse património?
Vai demorar décadas. A Cidade Velha é uma mina de ouro em termos arqueológicos. Ainda há muito por explorar, numa dimensão muito grande. A própria história da Cidade Velha ficou baralhada e confusa com as escavações, levando a divergências entre arqueólogos e historiadores. Por isso, tudo pode mudar com a intervenção arqueológica na Cidade Velha. Com a introdução da rede de esgotos, rasgamos a cidade ao meio e tirámos as nossas conclusões. É necessário continuar com as escavações. Tem os seus custos, mas tem também uma importância enorme. O futuro da Cidade Velha depende também das escavações futuras.
Com uma cidade que está a crescer, com projectos urbanístico em curso, como vai ser possível escavacar, passe a expressão, outra vez o centro histórico?
Bom, temos a própria rua principal da Cidade Velha que tem uma história. Mesmo aqui, onde estamos a falar (junto ao pelourinho português), por baixo de nós há muita história, há muitos vestígios históricos soterrados. É bom para a Cidade Velha tornar isso visível. Ou seja, vamos voltar a tirar o que foi encontrado e fazer obras para que isso fique à vista de todos. Turistas e nacionais. À parte disso, temos também vários monumentos em que, em redor, ainda não há qualquer ocupação urbana, pelo que os terrenos estão livres para escavações. Por exemplo, em redor do Convento (de São Francisco) há várias monumentos que, estando em ruínas, permitem fazer escavações para descobrir a dimensão das infraestruturas antigas. Aqui, no centro da cidade, bem como nos povoados, já não temos muito espaço. Muitas casas foram edificadas em cima dos monumentos soterrados. A própria cidade não é a cidade antiga. Mas há vários campos de investigação. Junto à Igreja da Misericórdia há um campo vasto e livre para escavações que, de certeza, trará mais património à luz do dia.
E o que vai ser desse património arqueológico todo? Vão criar um museu?
A Cidade Velha vai ter, pelo menos, dois museus. Um Museu Nacional - o antigo ministro da Cultura (cabo-verdiano, Manuel Veiga) prometeu isso - e o Museu da Escravatura.
E os projectos para o futuro. Há o Plano Director Municipal, há planos ligados directamente ao desenvolvimento e preservação do património. O que se pode prever que será a Cidade Velha no futuro?
O grande projecto da Cidade Velha é torná-la num sítio pedonal, com circulação restrita de viaturas e com todas as casas, edifícios recuperados, com um aspecto urbanístico espectacular, salvaguardando a tipologia da construção que temos, que é o que dá o grande valor à cidade. As pequenas casinhas, com uma porta e duas janelas. É a nossa tipologia de construção. É isso que valoriza a Cidade Velha e vamos manter essa tradição, recuperando todas as casas. Mas também vamos fazer vários roteiros turísticos, aproveitando a orla marítima, ligando os vários monumentos entre si. Vamos também desenvolver projectos na área da cultura, através de actividades culturais que sustentem o desenvolvimento do Turismo.
Em termos rodoviários, o acesso à Cidade Velha faz-se apenas por duas entradas. O que pensam fazer para atrair mais turistas e mais acontecimentos culturais à cidade?
Vamos construir um anel rodoviário em torno da Cidade Velha, que circunde a Cidade Velha, para evitar o fluxo de viaturas ao centro. Queremos tornar o centro da cidade como um local de relaxe por excelência.
O futuro está onde, então?
O futuro está no turismo, que é o ponto de alavancagem do desenvolvimento do município, a cultura vai suportar o turismo, ou seja, vamos ter de desenvolver cultura para poder tirar as vantagens do turismo. Queremos também desenvolver a agricultura e a pesca para poderem sustentar o turismo e a cultura. Está tudo interligado para o desenvolvimento do Turismo.
Por José Sousa Dias (texto) e Omar Camilo (fotos), serviço especial OJE/Lusa

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