quinta-feira, 6 de agosto de 2009

CV:ENTREVISTA COM OLAVO CORREIA

Aos 42 anos Olavo Correia já tem um longo percurso. O presidente da Promitur, cargo que ocupa desde 2009, já foi director-geral das Finanças, secretário de Estado do Tesouro e governador do Banco de Cabo Verde. Economista formado na Alemanha, Olavo Correia tem a grande paixão pelo turismo. Tem propostas para arrumar a casa e para assentar as bases para o pós-crise. Depois, que venha o resto: as parcerias, Portugal e investimentos. Muitos investimentos.

José de Sousa Dias:Onde se insere a Promitur na economia cabo-verdiana?
OlavoCorreia:A Promitur é uma associação cabo-verdiana de promotores de imobiliário turístico, um conjunto de empresas do sector que está no negócio do turismo residencial e que decidiu criar uma associação com o propósito de promover a melhoria dos negócios em Cabo Verde, neste e noutros sectores, e defender os interesses legítimos dos seus associados. Ao mesmo tempo, quer uma maior articulação com todas as entidades oficiais, num quadro de parceria e de uma pressão positiva, para que se possa reforçar o ambiente competitivo e melhorar o ambiente de negócios.
JSD:Há accionistas estrangeiros na associação?
OC:Todas as empresas de direito cabo-verdiano podem ter accionistas nacionais ou estrangeiros como gestores. Isso para nós é irrelevante. Mas há regras. As empresas nossas associadas devem ter contas auditadas e publicadas, não podem ter situações reincidentes de incumprimento fiscal.
JSD:Quantos são os associados?
OC:São 20 empresas, mas são 20 grandes empresas, que representam uma força económica e social muito importante em Cabo Verde.
JSD:Como está o sector do imobiliário turístico e residencial em Cabo Verde?
OC:Sabemos que o nosso mercado depende muito da evolução da procura externa, nomeadamente de alguns mercados emissores, como a Inglaterra, Irlanda, Alemanha, Portugal, Espanha e Itália. Todos esses países estão a sofrer uma grande recessão. É óbvio que isso tem implicações directas no nosso negócio e posso afirmar que, desde há um ano, a nossa situação tem sido muito crítica. Mas Cabo Verde tem enormes potencialidades neste sector. Temos um conjunto de activos que, devidamente valorizados, podem permitir a Cabo Verde tornar-se um país muito competitivo no segmento do turismo residencial.
JSD:Falou de activos. Quais são?
OC:Praias e afins mas, sobretudo, o aumento de negócios, a estabilidade política e social, a localização, toda uma rede de relações que estamos a estabelecer com a Europa no âmbito da Parceria Especial com a União Europeia (UE), mesmo o estatuto de Cabo Verde como país de rendimento médio são activos que jogam a nosso favor. Com tudo isso devidamente valorizado, com o enquadramento estratégico adequado, uma boa análise do mercado internacional e um posicionamento adequado nesse segmento de negócios, teremos condições para fazer do turismo residencial em Cabo Verde um sector económico da maior importância. Vamos aproveitar este período de crise para realizar algumas acções que são fundamentais para reforçar a competitividade de Cabo Verde. Temos também feito um conjunto de propostas ao governo, não só viradas para o combate à crise conjuntural mas também para questões estruturais, relacionadas com o aumento de negócios e a competitividade.
JSD:Nas ilhas da Boavista e do Sal há muitas obras paradas, o que impressiona. A crise chegou em força ao sector do imobiliário turístico?
OC:Chegou em força, sobretudo no Sal e na Boavista, com implicações directas para o sector, mas também para a economia do país. Grande parte da dinâmica da economia estava a ser impulsionada pelo negócio do turismo residencial, apoiada num conjunto de pequenas e médias empresas em torno deste segmento. Tendo em conta que essa procura está estagnada, obviamente que isso tem implicações, não só nas obras que estão em curso, como também no arranque de novos projectos. Mas temos a certeza e confiança de que, se fizermos bem o trabalho de casa, quando a crise for ultrapassada, estaremos em condições de termos um posicionamento importante neste segmento de negócio.
JSD:O que está mal na actual legislação do sector?
OC:O negócio do Turismo Residencial em Cabo Verde é novo e emergente. Temos a necessidade de criar um conjunto de regulamentos e um quadro legal. A Promitur está também a ajudar neste trabalho. A questão que se coloca é apresentar propostas concretas e fazer uma pressão positiva sobre quem tem os poderes para que esse quadro legal seja criado, mas de forma competitiva, que permita que o nosso enquadramento seja também um elemento de competitividade.
JSD:Quais são os principais problemas que apresentaram já ao governo?
OC:Desde logo, a questão da qualificação do destino. É óbvio que temos de melhorar, porque temos de evoluir. Os mercados emissores são cada vez mais exigentes. Passa pela questão da infra-estruturação das ilhas turísticas, desde a energia, água, saneamento, iluminação pública, estradas de acesso aos hotéis, vias pedonais, habitação social, enquadramento urbanístico, qualidade ambiental, enfim, um pacote que tem a ver com a melhoria da qualidade do destino. O governo mostrou-se disponível para olhar para essas questões.
JSD:Há ainda a questão dos benefícios fiscais. São atractivos?
OC:A questão da competitividade fiscal foi também levantada. A Promitur fez um conjunto de propostas ao governo. A primeira tem a ver com o tratamento idêntico em matéria do IVA entre o turismo hoteleiro e residencial. Seria uma medida muito importante para aumentarmos a competitividade e melhorar o preço do sector. Há também a questão da dupla tributação. Cabo Verde só tem um acordo nesse sentido, que é com Portugal. O Estado deve acelerar mais acordos com os nossos parceiros comerciais e outros para evitar a dupla tributação.
JSD:No quadro do combate à crise, a tesouraria das empresas está assegurada ou ainda há caminho a fazer?
OC:Há uma medida por nós proposta que tem a ver com isso mesmo. Pensamos que há aqui um perigo iminente de um risco de reputação do destino. Se os projectos que já foram vendidos, que já foram colocados no mercado internacional, que estejam em fase final de conclusão, não forem terminados no prazo contratado, podemos ter aqui um risco muito grande de reputação. A nossa proposta é simples: criar condições para reduzirmos e, se possível, eliminarmos esse risco.
JSD:Como?
OC:Através da criação de linhas de crédito, linhas de garantia, mesmo fundos de investimentos imobiliários, tal como fez agora Portugal, para permitir que empresas com activos possam ter acesso a financiamento e liquidez, permitindo terminar os projectos já em fase final de conclusão. O governo está a estudar isso e esperemos que haja uma decisão em breve, para dar uma injecção de liquidez às empresas que necessitem. Outra proposta tem a ver com a concessão de uma moratória no pagamento de dívidas resultantes da aquisição de terrenos. A procura externa está parada e é fundamental que haja uma concentração nos projectos em curso.
JSD:Acredita que 2010 possa marcar o fim da recessão?
OC:Sim. Esperemos que o crescimento retome em 2010, ou até finais de 2010. Até lá, teremos tempo para terminar os projectos em curso, fazer o nosso trabalho de casa, identificar as novas tendências de mercado e preparar os novos projectos para 2010 e para o período pós-crise.
JSD:Há capacidade institucional para isso tudo?
OC:Já chamamos a atenção para as questões que têm a ver com a melhoria dessa capacidade, quer a nível do Ministério da Economia, quer na Cabo Verde Investimentos, quer ainda na regulação, fiscalização e planeamento estratégico, que são aspectos muito importantes para definirmos o enquadramento e colocar todos os actores a trabalhar no mesmo sentido. O papel das entidades públicas é fundamental, claro que sempre em concertação com o sector privado.
OJE/LUSA

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