domingo, 23 de agosto de 2009

FADO:Candidatura à UNESCO visa dar a conhecer o fado em profundidade

"Erradicar" a ignorância sobre o Fado é o principal objectivo da candidatura a Património da UNESCO, projecto que mexe com a comunidade fadista onde, se é unânime que o Fado merece a distinção, também há quem esteja contra a candidatura.

LISBOA-A candidatura a Património Cultural Oral e Imaterial da UNESCO está em preparação desde 2005 e aguarda agora a publicação pelo Governo da portaria que regulamenta a apresentação e formalização do processo.

Depois desse passo, a candidatura será então apresentada à UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), em princípio durante o primeiro semestre de 2010.

"Hoje, a candidatura está pronta, mas o trabalho não vai parar e o entusiasmo é muito grande. O desejo de entregar uma coisa extremamente digna na UNESCO existe e o que nós desejamos é que a UNESCO o receba bem e que nos dê uma resposta positiva", adiantou o porta-voz da candidatura, Carlos do Carmo.

No entender de Carlos do Carmo, o objectivo da candidatura passa, essencialmente, por aumentar a cultura nacional sobre um dos seus maiores símbolos.

"Se caminharmos na cidade de Lisboa e perguntarmos a uma pessoa se gosta de Fado, ela vai responder, mas se depois perguntarmos se ela percebe, ela vai dizer: 'Ai isso não, não sei nada de Fado, gosto muito de ouvir A ou B, mas até nem sei muito bem o que é que está a cantar' e é isto que se pretende erradicar", explicou o fadista.

Para o editor discográfico Samuel Lopes, esta pode ser "uma óptima oportunidade para o Fado".

"Tem-se verificado, particularmente nestes últimos anos, uma grande apetência nos mercados internacionais para este estilo de música e com esta proposta penso que o Fado poderá ganhar outro reconhecimento e outra dimensão", apontou o responsável pela editora Difference.

Já para Carlos Gonçalves, guitarrista, o Fado "merece" ganhar a distinção por parte da UNESCO.

"É uma das cantigas do mundo em que a escala é como a ópera, vai da tragédia, com letras mais românticas, até ao jocoso. Mais nenhuma cantiga do mundo popular é assim e o Fado merece por causa disto", entende o guitarrista que acompanhou Amália Rodrigues durante 30 anos.

Abrir portas e internacionalizar

Dentro dos novos valores do Fado, o fadista Pedro Moutinho também vê a candidatura com bons olhos.

"Acho que é sempre muito importante para o Fado e para os fadistas esta candidatura porque poderá também abrir portas e acho que é sempre um grande prestigio para o Fado uma candidatura destas", disse o fadista, para quem o Fado "merece tudo".

Pertencente a uma geração mais antiga, o fadista João Braga admite que se a candidatura servir para conduzir o Fado ao "patamar elevadíssimo" em que Amália Rodrigues o colocou, será "a favor" e dará o seu "total apoio", mas afirma-se um "céptico" depois de ter lido a convenção da UNESCO.

"Com o canto Flamenco aconteceu uma coisa parecida, candidataram-se à mesma categoria e a candidatura foi chumbada exactamente porque já existe tanto suporte material, em vinil, em acetato, em CD, em vídeo, em filme, em livro, em jornais, em tudo quanto é suporte técnico e por isso o Flamenco não reúne as condições expressas na convenção. Com o Fado é igual, está sobejamente sustentado", defendeu o fadista em entrevista à Lusa.

Espelho da controvérsia que o assunto tem na comunidade fadista, no sítio "Portal do Fado" é possível perceber como este assunto não tem passado à margem dos que vivem do e para o Fado.

Se por um lado há quem apelide a candidatura de "trafulhice" ou diga que o que está a ser proposta a Património Imaterial da UNESCO é a "estupidez portuguesa", outros há que dizem acreditar "no reconhecimento da UNESCO".

Do porta-voz da candidatura, Carlos do Carmo, fica um último apelo ao Ministério da Cultura e ao dos Negócios Estrangeiros: "Por favor, quando estas coisas começarem a andar, não as guardem nas gavetas".
SIC/LUSA

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