PRAIA-Diversos acontecimentos marcaram 2009 no plano cultural, mas a atribuição do Prémio Camões, o mais importante galardão literário da língua portuguesa, ao poeta Arménio Vieira e o reconhecimento pela UNESCO, da Cidade Velha como Património Mundial da Humanidade, afiguram-se como marcos indeléveis do ano que agora finda.
Nesta retrospectiva, a agência Inforpress apresenta, também, o sumo e o resto dos acontecimentos num ano recheado de histórias, em que partiram figuras como os poetas Mário Fonseca, Yolanda Morazzo, e os músicos e compositores Manuel d’Novas, Biús e Lela Viola.
O ano de 2009 começou para o arquipélago sob o signo de reconhecimento. De facto, a atribuição do Prémio Camões a Arménio Vieira, a 02 de Junho, foi o “reconhecimento da literatura e da visão literária importantíssima” do poeta cabo-verdiano, como frisou na ocasião Helena Buescu, presidente do júri.
O júri esteve reunido, no Rio de Janeiro, Brasil, durante quatro horas para escolher o nome do galardoado que recebeu cem mil euros, cerca de 11 mil contos cabo-verdianos.
Arménio Vieira, o primeiro cabo-verdiano a receber o Prémio Camões, nasceu na Cidade da Praia, na ilha de Santiago, Cabo Verde, em 24 de Janeiro de 1941.
Além de escritor, é jornalista, com colaborações em publicações como o “Boletim de Cabo Verde”, a revista “Vértice”, de Coimbra, “Raízes”, “Ponto & Vírgula”, “Fragmentos” e “Sopinha de Alfabeto”. Arménio Vieira foi redactor no jornal “Voz di Povo”.
O Prémio Camões – criado em 1988 pelos governos, português e brasileiro –, distingue todos os anos escritores dos países lusófonos.
Destaque de 2009 no plano cultural foi também o reconhecimento, pela UNESCO, da Cidade Velha, na ilha de Santiago, como Património da Humanidade.
A notícia, divulgada em Julho, em Sevilha, Espanha, onde decorreu o Fórum Mundial, foi recebida com “grogue” e grande alegria pela população cabo-verdiana.
Conforme a imprensa nacional e internacional, batucada e muita música fizeram-se sentir na Cidade Velha, numa manifestação marcada pelo repicar do sino da igreja de Nossa Senhora do Rosário, um dos monumentos históricos daquela urbe, enquanto a população se mergulhava numa verdadeira festa onde, além da dança, também não faltaram as iguarias típicas daquelas paragens: cachupa e caldo de peixe, com grogue e licor tradicional.
O ministro da Cultura de Cabo Verde, Manuel Veiga, reagiu à notícia com “uma satisfação enorme, do tamanho do mundo”, como fez questão de realçar, desabafando, por outro lado, que sempre teve a percepção da Cidade Velha como Património da Humanidade.
Para o governante, esta distinção significou também o reconhecimento da grandeza da “criolidade” cabo-verdiana, da sua singularidade, da antropologia e da diferença cabo-verdiana.
A mesma opinião foi partilhada pelo primeiro-ministro de Cabo Verde, José Maria Neves, para quem se tratou de uma “estrondosa vitória de Cabo Verde nos últimos anos”.
A candidatura da Cidade Velha a Património da Humanidade incentivou toda a população de Cabo Verde, tendo o Presidente da República, Pedro Pires, apostado pessoalmente na diplomacia internacional, sobretudo junto das cooperações com Espanha e Portugal.
Em ano de distinções, outros agentes culturais viram os seus trabalhos premiados. Foram os casos do poeta e escritor cabo-verdiano radicado em Portugal, José Luís Tavares e da jovem cantora crioula Mayra Andrade.
O primeiro, foi distinguido pelo Ministério da Cultura de Cabo Verde com o Prémio Pedro Cardoso, pelo livro inédito escrito em Língua Cabo-Verdiana intitulado “Tenpu di Dilubri” (“Tempo de Dilúvio), no valor de 1,2 milhões de escudos (10.900 euros), o de maior dotação monetária no país.
O mais premiado dos escritores cabo-verdianos, o autor de “Paraíso Apagado por um Trovão” conquistou, pela segunda vez consecutiva o prémio “Literatura para Todos”, promovido pelo Ministério da Educação do Brasil, com a obra inédita “À Bolina ao Redor do Natal.
Cesária Évora, a mais internacional das cantoras do arquipélago, foi condecorada pela França, tendo recebido, em Paris, das mãos da ministra da Cultura, Christine Albanel, as insígnias de Cavaleiro da Legião de Honra.
A cantora Mayra Andrade viu o seu mais recente álbum de originais, “Stória, Stória” distinguido com Prémio de Crítica Alemã, cinco meses após o lançamento desse trabalho, depois de ter conquistado, em Portugal, o Disco de Ouro.
2009 engalanou-se também de música, de muito boa música, com festivais e espectáculos, paralelamente às actividades da escrita, pintura e outras.
Na música, área em que o país continua com um “PIB per capita” invejável, o ano que agora termina foi também marcante para os novos ritmos da música das ilhas. Muito boa gente, consagrada e estreantes, viram os seus trabalhos editados no mercado discográfico nacional e internacional.
De entre os artistas que editaram seus álbuns em 2009, destacam-se, entre outros, os trabalhos “Nos Encontro”, de Djuta Barros; “Totalmente di Bo”, de Beto Dias; “Morabeza”, de Maria de Barros; “Kriola”, estreia absoluta do compositor Antero Simas; “Stória Stória”, de Mayra Andrade; “Stribilim”, de Gylito Semedo; “Nhô Nani”, álbum homónimo do violonista foguense “Nho Nani”; “Nós Património”, do grupo de batucadeiras Nós Herança; “Nha Sentimento”, da Diva Cesária Évora; “Lua água clara”, de Vasco Martins; “Nha Vivênvia”, do intérprete foguense, Dany Lobo; “I´m Gonna Change”, do jovem cantor Hugo e ”Reencontro de melodias”, de João Eugénio.
No domínio da produção literária, o ano conheceu várias publicações, de autores novos e consagrados.
O jornalista António Monteiro deu à estampa a sua “Primeira Antologia Pessoal”, Daniel Benoni apresentou o seu sexto livro, “Pedaços de uma Vida”; o historiador Daniel Pereira, a “Memória sobre Cabo Verde do Governador Joaquim Pereira Marinho & outros textos”, Filinto Elísio, “Li cores & Ad vinhos”, Brito Semedo, “Na esquina do Tempo – Crónicas de Diazá”.
João Lopes Filho, com “Crónica do Tempo que Passou”; José Luiz Tavares, com “Lisbon Blues seguido de Desarmonia”; Samuel Gonçalves, com “Aquele retrato”; Alveno Figueiredo e Silva, com “Retalhos de Música Afro-Luso-Brasileira – Queijas, Tchufe e Lobo – Reis, crioulos e morna dos anos 30”; João Silva, com “Djunga de Biluca – de Ribeira Bote a Roterdão”; Sabino Évora, com “Lombianinho” e Arsénio de Pina, com “Passador de Pau”, figuram entre os autores que viram as suas obras publicadas em 2009.
Mas, ainda há mais. No domínio da escrita ficcionada, em 2009 o mercado editorial viu outros tantos volumes. O escritor Germano Almeida voltou com a obra “Viagem pela História de (Ilha) São Vicente”; João Miranda, com “Terra e Mar"; Zaida Sanches, com “Colecção Stera”, Maria João Gama, com “O Universo Feminino em António Aurélio Gonçalves”; Natacha Magalhães, com “Mãe, conta-me uma história”; Bitu Melo, com “A Bisca sua Génese e as Regras da sua Prática “, para além do livro “De Rabidantibus”, do falecido jornalista cabo-verdiano Manuel Delgado.
O ano 2009 ficou igualmente marcado pela iniciativa do Ministério da Cultura em promover, no Mindelo, uma mesa-redonda sobre o novelista António Aurélio Gonçalves, durante dois dias, com a presença de vários especialistas da obra do escritor, falecido a 30 de Setembro de 1984, vítima de atropelamento.
Marco cultural do ano que agora finda foi também a realização conjunta Angola, Cabo Verde e a Fundação Amílcar Cabral, do Simpósio Internacional sobre o Campo de Concentração de Tarrafal.
Dos tradicionais festivais de música, realizados anualmente em todo Cabo Verde, com Baía das Gatas, Gambôa e Santa Maria à cabeça, este ano o de Santa Maria não chegou a realizar-se devido às chuvas de Setembro e por precaução à epidemia da dengue que fustigou o arquipélago.
De todo o modo, o público rendeu-se, mais uma vez, com o “Março – Mês do Teatro”, em saudação aos 130 anos da cidade do Mindelo, bem como com o habitual festival do teatro Mindelact.
Em ano de crise internacional, os cabo-verdianos não deixaram de dançar com outros tantos espectáculos musicais que, um pouco por todo o país, se realizaram no país de morabeza.
Infelizmente, o ano de 2009 foi também de perdas irreparáveis para a cultura cabo-verdiana, com o desaparecimento físico de algumas das suas figuras, como foram os casos da poetisa Yolanda Morazzo, falecida aos 81 anos, do poeta e ensaísta Mário Fonseca e dos músicos e compositores compositor Manuel d’ Novas.
Sapo.cv/Inforpress/Fim
Sem comentários:
Enviar um comentário
Comentar com elegância e com respeito para o próximo.