Acabou a lua-de-mel, Barack-Por Germano Almeida
Obama foi eleito com uma enorme maioria, gerando uma onda de entusiasmo como há muito não se sentia na política americana. Poucos imaginariam, por isso, que, apenas treze meses depois, a sua Taxa de Aprovação estivesse abaixo dos 50 por cento. Pois é, Barack: parece que a lua-de-mel acabou mesmo.
Esse sentimento de fim de festa é ainda mais paradoxal se nos lembrarmos que amanhã, 10 de Dezembro, Barack Obama vai receber, em Oslo, o Prémio Nobel da Paz, tornando-se no Presidente da história americana que mais rapidamente mereceu essa distinção da Academia Norueguesa.
A decisão do Comité Nobel causou reacções contraditórias, mas terá sido baseada na declaração de Obama (proclamada no discurso de Praga, em Abril passado) de que é contra as armas nucleares e fará tudo, enquanto Presidente da nação mais poderosa do Mundo, para construir um Mundo livre do risco de auto-extermínio.
Pode parecer uma intenção demasiado genérica e até um pouco ingénua, mas a verdade é que Obama foi o primeiro Presidente americano a defini-la nesses termos tão claros.
Essa posição anti-armas nucleares integra-se num conjunto de gestos e atitudes tomadas por Obama que mostraram um salto em frente para uma mudança real em Washington – mas que têm ficado na sombra, apagadas por problemas mais complexos e nebulosos, como a questão do AfPak, a Reforma da Saúde ou a recuperação económica.
A esquerda já se demarca
Uma fatia dos democratas que se entusiasmaram com a Obamania começa a declarar a sua «desilusão». O anúncio do Presidente de enviar mais 30 mil soldados americanos para o Afeganistão foi, para muitos deles, a gota de água.
Os atrasos no arranque do processo de paz no Médio Oriente e uma certa ambiguidade na forma como tem tratado os grandes interesses financeiros e empresariais (um dos pontos fortes da sua campanha foi, de facto, a promessa de acabar com a desregulação dos mercados e não será sustentável que não a cumpra) aumentam o leque de críticas da área mais à esquerda do Partido Democrata.
Michael Moore, polémico documentarista e um dos mais ácidos opositores dos anos Bush, foi um dos liberais que se tinha rendido a Barack Obama.
Durante a campanha presidencial, assumiu o apoio ao nomeado democrata, esquecendo, por uma vez, o argumento dos esquerdistas de que «não há diferença real entre republicanos e democratas, porque os dois campos estão integrados no sistema de poder».
Este tipo de lógica levou uma parte da esquerda americana a assistir, de forma passiva (será melhor dizer... cúmplice?), às duas eleições de George W. Bush, recusando-se a apoiar Al Gore, em 2000, e John Kerry, em 2004, por considerar esses dois nomeados democratas como «mais do mesmo».
O apelo inovador de Obama fez com que essa esquerda mais radical desse uma oportunidade ao jovem senador negro que aparecia do Illinois.
Mas essa franja «liberal» parece estar já a demarcar-se: «Fiquei francamente desiludido ao ver Obama a anunciar um reforço de tropas. Ele preferiu agradar aos generais e não seguiu o seu coração. O Obama que apoiei para a Casa Branca não foi este», comentou, desiludido, Michael Moore, a uma repórter japonesa, no dia do discurso de West Point.
Mesmo Dick Durbin, senador sénior do Illinois e um dos padrinhos da ascensão política de Obama no Partido Democrata, não escondeu o seu desapontamento com a decisão do Presidente para o AfPak. «Infelizmente, Barack está a cometer um erro colossal», apontou Durbin.
O alarme dos independentes
Observações como estas dão conta de um perigo real para o futuro da Presidência Obama: com a ala esquerda do Partido Democrata a descolar, qual será o eixo da sua base de apoio político?
Uma resposta mais imediata apontaria para os independentes. Na América, há três grandes campos políticos: os democratas, os republicanos e os independentes.
Cerca de um terço do eleitorado não tem preferência partidária declarada – e, geralmente, é essa fatia que elege os Presidentes.
Na corrida de 2008, os dois nomeados mostravam forte propensão para atrair os eleitores independentes. Mas no duelo final, Obama arrasou McCain nesse sector crucial.
Sucede que os números mais recentes apontam para uma perda massiva dos independentes, que se mostram cada vez mais críticos com o Presidente. A manter-se esta tendência, Barack Obama corre mesmo o risco de não conseguir ser reeleito.
Voltar a acender a luz do sabre
Nenhuma dúvida: a lua-de-mel de Obama com os EUA acabou mesmo – e basta dizer que apenas 26 por cento dos americanos, de acordo com sondagem feita em vésperas da cerimónia de Oslo, consideram que o Presidente merecia receber, já este ano, o Prémio Nobel da Paz.
Boaventura de Sousa Santos, em artigo assinado na revista «Visão», chamou a Obama o «grande ilusionista», capaz de criar uma ideia de «mudança» em temas que, afinal, pouco ou nada terão mudado.
Mas pode ainda ser cedo para se decretar o fim da Obamania. Numa entrevista no «Daily Show», David Plouffe, estratega muito próximo do Presidente, que dirigiu a sua campanha, falava sobre as qualidades de Obama com tanto entusiasmo que Jon Stewart o interrompeu, perguntando: «Mas será que temos um Presidente tipo Mestre Jedi, com uma espada laser e tudo??»
Sorrindo com a ironia, Plouffe não se descoseu e lançou a resposta: «Parece que sim. E acreditem: mesmo quando as coisas parecem estar a piorar, no momento certo, Barack vai voltar a acender a luz do sabre». Será mesmo?
ABOLA.PT-Germano Almeida é jornalista de A BOLA e autor do blogue CASA BRANCA
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