Quando Ana Tembe olha para o mar, sabe que está a viver em tempo que lhe é emprestado pelo mar. A pequena barraca onde vive junto à praia, em Maputo, está cada vez mais perto da água, ou vice-versa.
Quando o mundo discute problemas do futuro, Ana preocupa-se com o presente. Está quase rodeada por água e, pelo menos uma vez por ano, a água entre pelas canas que compõem as paredes da sua pequena casa. De ano para o ano, a situação agrava-se.
“Quero que as minhas crianças estejam seguras”, desabafa. “Vamos ter que mudar para outro lugar mas não temos dinheiro nem opções”, conta a moçambicana.
O país é um dos mais mencionados no grupo de maior risco no que respeita às alterações climáticas. Moçambique tem uma das mais longas costas africanas, com 2700 quilómetros de praia e 13 milhões de residentes nas zonas costeiras. O número é ainda maior quando se fala das populações que habitam as margens dos rios.
“Os moçambicanos já estão a sofrer. As alterações ao clima vão mudar as condições de vida e a dignidade do povo”, alerta a Ministra do Ambiente, Alcinda Abreu.
Progresso lento
Inúmeros estudos foram já encomendados e o governo moçambicano é apontado como um dos poucos executivos que se tem envolvido no problema mas, enquanto muito trabalho foi já desenvolvido no papel, no terreno o progresso é bastante mais lento.
Um dos poucos projectos em marcha é um dique a norte de Maputo, construído pelo governo para dar protecção a uma estrada principal. Um pouco mais a sul, o conhecido bairro de lata de Mafalala foi equipado com um canal de drenagem que previne as cheias anuais que consigo trazem doenças e a pobreza extrema.
“Nós temos consciência da seriedade das alterações climáticas e estamos a fazer o nosso melhor na tentativa de encontrar soluções”, explica o conselheiro Mário Macaringue, um dos principais instigadores do projecto.
Mas, para um país como Moçambique, muitas das soluções são demasiado caras para os bolsos do país.
Cidade modelo na gestão de água
A vários milhares de quilómetros de distância, no hemisfério norte do planeta, a cidade de Roterdão tem o capital mas tem também os problemas. A urbe holandesa não é um destino turístico mas as autoridades estão decididas a transformar Roterdão num modelo internacional na gestão dos recursos de água.
Com grande parte do território abaixo do nível do mar, a Holanda batalha contra a natureza há séculos, recorrendo a diques e a moinhos de vento para controlar os movimento de água.
Daniel Brakman lembra-se da última vez que as defesas holandesas foram quebradas, em 1953. “Era um jovem rapaz e estava em casa com o meu irmão e a minha irmã. A casa ficou rodeada por água que cobria todo o nosso campo de visão”, lembra o barbeiro de 63 anos.
A inundação matou quase 2 mil pessoas e levou as autoridades a desenvolverem um plano de emergência que coloca hoje Roterdão sob protecção de vários quilómetros de diques.
Muralha de protecção
Uma rede de comportas, trancas e barreiras representa a maior defesa marítima do mundo construída segundo a estatística de que só poderá ser quebrada uma vez em cada 10 mil anos.
Os holandeses são os peritos máximos na matéria mas mesmo eles temem que as alterações climáticas quebrem as defesas que são de importância crucial na história e no futuro do país.
O problema que afecta a Holanda não é apenas a subida do nível do mar mas também o aumento populacional que coloca maior pressão sobre os sistemas de canalização.
O país estabeleceu um novo plano que inclui a construção de barreiras mais altas, esquemas mais naturais para alargar os rios e reforçar a costa com areia. A Holanda planeia também iniciar a construção de casas flutuantes e a criação de sistemas tecnológicos de alerta que permitam por em marcha planos de evacuação.
Ao contrário do que acontece em Moçambique, a população holandesa parece confiante de que, quaisquer que sejam os problemas futuros, tal como no passado, o governo continuará a encontrar soluções.
BBC Para AFRICA-Por Michael Hirst em Rotterdam e Kate McGeown em Maputo
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