PRESIDENCIAIS: “acho que reúno as condições” para ser PR - JCF
Candidato presidencial em 2001, derrotado na primeira volta, JCF volta a posicionar-se na corrida para 2011. Adverte, no entanto, que apenas avança com uma candidatrua presidencial se tiver o apoio político do MpD, partido no qual revê enquanto militante do Estado de Direito. Reconhece ter perfil para o cargo e acaba de manifestar sua disponibilidade.
RA:É verdade que em 2001 teria sido convidado por José Maria Neves para ser candidato apoiado pelo PAICV para as presidenciais?
JCF:(risos) - Eu acho que ainda é cedo para eu me pronunciar sobre este assunto. Algum dia poderei falar sobre isso. Eu acho que ainda é cedo para falar das condições que me permitiram, levaram de certo modo a avançar com a minha candidatura em 2001. Mas é evidente que eu não era nenhum adolescente para avançar com a minha candidatura apenas por uma aventura. Evidentemente que houve um certo número de condições, pressupostos para a minha candidatura, alguns falharam durante esse percurso, mas eu não sou do tipo para estar a queixar-me, arranjar desculpas: fui até ao fim e tive o resultado que tive e não estou arrependido de ter participado na corrida presidencial.
Eu acho que foi positivo do ponto de vista da pedagogia democrática. Aceitei os resultados sem problemas e contribuí, em certa medida, para uma experiência única de uma segunda volta nas eleições presidenciais em Cabo Verde e um interessante debate na sociedade cabo-verdiana sobre a função presidencial no nosso sistema político vigente.
Então, foi-lhe ou não endereçado o convite?
Na altura houve outro candidatos presidenciais que veio a dizer ter sido convidado pelo dr. José Maria Neves para ser candidato com o apoio do PAICV e que depois teria voltado atrás. E, portanto, não vale à pena agora trazer mais elementos. Talvez um dia se venha a escrever alguma coisa sobre o período recente da história de Cabo Verde e posso vir a referir-me, com mais minúcias, sobre essa minha candidatura presidencial em 2001. Sem dramas, tranquilamente.
Para as eleições presidenciais em 2011 fala-se de alguns nomes que podem ser apoiados pelo MpD e de entre os quais o senhor. Se o MpD o convidasse para ser candidato, aceitaria participar na corrida presidencial?
Eu não sei se os procedimentos estatutários do MpD permitem convidar alguém. Suponho que seja a Direcção Nacional a deliberar formalmente o apoio a alguma candidatura, que não é de origem partidária mas sim dos cidadãos mas que os partidos podem apoiar. O MpD pode estimular ou apoiar uma candidatura de uma pessoa que sabem ter disponibilidade em ser candidato.
A segunda coisa que posso dizer é a seguinte: a experiência que tenho de Cabo Verde felizmente ou infelizmente, independentemente, digamos, do perfil do titular do cargo para Presidente da República definido pela Constituição que será assegurado na prática política, na prática eleitoral, a verdade é que neste momento não há condições para que um candidato ganhe as eleições presidenciais sem apoio de um dos grandes partidos. Tem que ter o apoio do MpD ou o apoio do PAICV.
Um candidato independente que avance para a candidatura presidencial e que não consegue apoio nem do PAICV nem do MpD, ou se estes partidos apoiarem uma candidatura deles, digamos, tem muitas dificuldades em ganhar as eleições. Pode ir e fazer uma boa campanha e ter um resultado razoável; e também parto da idéia de que não se vai para as eleições só para ganhar, evidentemente que uma candidatura em principio é para chegar ao poder também é legitimo o exercício do Poder, nem todos os partidos ganham as eleições por exemplo, nem vai ser governo mas pode ter um bom grupo parlamentar, ser uma força de equilíbrio entre as grandes forças políticas.Na mesma óptica pode haver candidatos presidenciais que vão atrás da idéia de divulgação de idéias, de um projecto político ou de sociedade, de cidadania, um exercício para o futuro etc., mas para ganhar é preciso ter o apoio de uma das duas grandes forças políticas em Cabo Verde. A prática mostra isto com clareza.
Terceiro ponto que queria lhe avançar: eu apesar de não estar na política partidária activa desde dia 16 de Fevereiro de 1998, que foi o último Congresso do PCD mantive sempre e até agora uma atitude de atenção em relação ao fenómeno político, de intervenção cívica, crónicas em jornais, entrevistas para os órgãos de comunicação social, participação em revistas de especialidade jurídica, conferências e palestras nos municípios, para jovens, nos Liceus, Universidades etc. Isto significa que não fiquei desatento ou fora do que se passa na vida política e social do país. Intervenho como cidadão e como um militante do Estado de Direito e da Democracia.
Neste momento, a minha postura em Cabo Verde é a de um cidadão que pretende qualificar a Democracia, aprofundá-la e desenvolve-la. Tenho insistido na idéia de que a democracia é um processo irreversível em Cabo Verde. Não há lugar a recuo. Não é possível regressar ao tempo do partido único como é evidente. É uma democracia que tem algumas fragilidades isto é os pilares do Estado de Direito e da Democracia ainda são poucos consistentes. O que temos ainda é insuficiente. Por exemplo a independência e consistência do poder judicial, uma imprensa livre e forte e uma opinião pública também crítica e consistente. São três pilares do Estado de Direito que não temos, ainda, em Cabo Verde pelo menos se pensarmos em termos de pilares já sólidos. Portanto a minha luta tem sido esta.
Quando tive a iniciativa de criar a Revista Direito e Cidadania, ou de criar o Instituto Superior de Ciências Jurídicas e Sociais pensei nisso: a minha intervenção nos Jornais, a minha intervenção cívica é para ajudar, para contribuir, na medida das minhas possibilidades e das minhas forças, para fortalecer esses tais pilares da Democracia, do Estado de Direito, da cidadania democrática que supõe também o desenvolvimento cultural no seu sentido mais amplo e fecundo.
Eu acho que no sistema do governo que nós temos na Constituição, o Presidente da República tem que ter um papel fundamental para fortalecer os pilares de que lhe falei. Contrariamente o que algumas pessoas dizem hoje em dia, o Presidente da República tem ou pode ter um papel decisivo no sistema de governo, num seu bom funcionamento, dependendo do equilíbrio de forças no parlamento, se tem maiorias absolutas ou não, se governos são maioritários ou não.
A tal magistratura de influências...
A magistratura de influência é fundamental. Um Presidente da Republica para além de poderes visíveis que as pessoas conhecem, têm outros. Bem, tem o conhecido poder de fiscalizar a constitucionalidade de normas, o que é um importante poder conformador, de defesa da vigência da Constituição. Tem o poder de veto político que também é importante. Um Presidente que veta politicamente um diploma deve explicar também à sociedade por que o vetou. Porque o veto não é só por ser inconstitucional. Um Presidente entre nós tem o poder de vetar um diploma sobre a educação, sobre a saúde ou sobre a segurança ou justiça mas não pode fazê-lo arbitrariamente. É evidente, mas sim por razões de justiça, de adequação aos fins do Estado de Direito; é preciso fazê-lo com um certo equilíbrio. Ele tem o poder de nomear o primeiro-ministro, membros do governo, tem poderes no âmbito do sistema embora isso seja hoje mais discutível mas sobretudo um Presidente da República tem poderes que eu acho que são poderes invisíveis; é por isso que é importante o diálogo com as forças políticas e sobretudo com a sociedade civil. Um Presidente da República acaba por ter, mesmo no nosso sistema muitos poderes. Nada impede por exemplo o Presidente da República de falar sobre o estado do ensino superior no país, sobre a qualidade do ensino, se o ensino superior está a ir no bom caminho ou senão. Nada impede o Presidente da Republica de numa conferência de imprensa, numa declaração à Nação de falar sobre a política da saúde ou de justiça por exemplo. Se a política do governo em relação à epidemia de dengue está correcta. Em matéria de política externa, das nossas relações com a África, com a Europa, no quadro da CPLP, sobre a diáspora. Sim a idéia de que ele é um garante de unidade nacional, representante da Nação, leva a que um Presidente tenha um papel importante em relação às nossas comunidades no exterior. Ele pode e deve ser um elemento-chave no diálogo entre o país e a diáspora. É claro que não pode interferir na política do governo para a diáspora, da emigração nem na política da Justiça: são competências constitucionais do governo e o Presidente não pode aí interferir. Pode dialogar com a sociedade, pode emitir opinião sobre a segurança, a justiça.
Sobretudo num Estado de Direito e da Democracia existe fluxo de valores e de princípios de democracia, do Estado de Direito, de liberdades, de direitos individuais, quer dizer, estes são os pontos fortes que se o Presidente for um democrata convicto, um militante do Estado de Direito, tem um papel relevantíssimo para aprimorar a democracia e fortalecer o Estado de Direito exercer a sua magistratura de influência política e moral sobre o conjunto da sociedade e também ajudar o governo a exercer o seu poder. Quero dizer, enfim que não se pode ser um Presidente omisso e de braços cruzados. É claro que também não pode ser um presidente que interfere nas esferas que são do governo mas deve ser um Presidente presente, atento, uma instância viva e crítica sempre que necessário.
Vejo-o a falar do cargo presidencial com tanto entusiasmo que a conclusão que chego é que está disponível a avançar.
(risos) Não quero dizer que sempre fui entusiasta desse sistema de governo, como o nosso. Eu acho que é um bom sistema para Cabo Verde...
Mas notei que os seus olhos brilhavam mais, os gestos mais nervosos quando começou a falar sobre as presidenciais...
Não: eu sou adepto, às vezes entusiasta desse sistema de governo que acho que ainda não foi suficientemente testado em Cabo Verde e pode ser melhor testado. Já agora posso dizer que pode existir um exercício de função presidencial diferente do que temos tido até agora.
Mas respondendo à sua pergunta digo que se sou militante da Democracia do Estado de Direito e de cidadania e se eu já disse que o Presidente pode ter um papel importante nisso, se o meu contributo para o reforço do Estado do Direito e da Cidadania passar por eu disputar e eventualmente exercer o cargo de Presidente da Republica não estou em condições de dizer que não.
Quero dizer com toda a frontalidade e sem falsas modéstias que entendo ter as condições para tanto, tenho idade suficiente, percurso político, e acho que reúno as condições. Evidentemente, um pressuposto fundamental seria ter apoios claros e consistentes para ser uma experiência bem sucedida e posso adiantar-lhe mais: não posso negar até porque na Convenção do MpD pessoas citaram o meu nome, assim como em artigos publicados na imprensa a estimularem a uma candidatura: há várias figuras do MpD, dirigentes nacionais, deputados, dirigentes locais, personalidades independentes, ou ligadas à UCID, ou até pessoas próximas do PAICV que me têm abordado e me têm estimulado ou encorajado a candidatar-me. E portanto quero dizer que se aparecerem condições de algum consenso, que dá algum peso a uma candidatura de sucesso, ponderarei e poderia então mostrar a minha disponibilidade. Agora, o MpD está a sair de uma Convenção e tem uma nova liderança e não seria curial da minha parte estar a pôr-me em bicos de pé, a fazer alguma especulação e ruído no processo político de um partido de que fui um dos fundadores, estive no seu primeiro governo como MNE, fui da sua Comissão Política e de que me afastei em 1994, mas digamos um partido que perfilha muitos valores que comungo. Creio que até ao fim do corrente ano poderei pronunciar-me sobre esta questão de forma mais clara e decidida. Se anunciar que estou disponível e quando o fizer é porque irei até ao fim.
Mesmo sem o apoio partidário avança?
Não. Quer dizer, eu não vou para nenhuma aventura. Se algum dia vier a anunciar que estou disponível para a candidatura presidencial é porque na avaliação que eu fiz acho que tenho apoios suficientes para ser uma candidatura de sucesso.
Imaginemos um cenário. Muitos analistas políticos cabo-verdianos consideram que o senhor vai ser o candidato apoiado pelo MpD. Caso isso vier a concretizar qual dos cinco candidatos do PAICV que já manifestaram a sua candidatura gostaria de ter como adversário?
(risos) Isso é um exercício complicado que não vou estar em condições de fazer. Claro que às vezes escrevo como comentador e tenho mais liberdade para dizer certas coisas.
Como comentador sei que já foram ventilados nomes como os de Aristides Lima, de Hopffer Almada, Manuel Inocêncio, Silvino da Luz. Há dias também ouvi a falarem no Corsino Tolentino. O que posso dizer é que são pessoas que têm requisitos para se candidatar, são pessoas com posições de proeminência no quadro do PAICV ou muito próximo dele. Um é presidente do parlamento, já foi líder do PAICV: outro já foi ministro da justiça, anos como deputados, outro já foi ministro da Cultura: outro embaixador, ministro, portanto pessoas com experiência política e governativa.
Como observador parece-me que as várias pré- candidaturas ou candidaturas a candidaturas têm a ver como já disse anteriormente com a existência de sensibilidades dentro do PAICV. E se a minha leitura não estiver errada, pelos apoios que parece que publicamente possui, teria também apoios dos sectores mais tradicionalistas ou conservadores do partido, sector que as pessoas chamam de sector pirista, parece até ter apoios de personalidades como Felisberto Vieira, Sidónio Monteiro, e tudo isso pode ser importante para a candidatura do Aristides Lima, no quadro do PAICV. Sobretudo a partir do momento em que José Maria Neves se recandidatou à liderança do PAICV. A menos que num "golpe de teatro" o José Maria Neves venha a ser o candidato presidencial. Não se trata, para alguns comentadores de uma hipótese totalmente de afastar. Vamos ver por exemplo o que se passa no âmbito da revisão Constitucional, se haverá inclusão ou não de uma cláusula que separe no tempo as eleições legislativas das presidenciais.
As outras candidaturas parecem-me candidaturas fora desse quadro de apoios. Alguns casos parecem mais balões de ensaios, alternativas numa disputa entre vários segmentos dentro do PAICV. Se posso ir um pouco mais longe, parece-me que JMN neste momento não terá o controle total do aparelho do partido sobretudo do sector mais claramente do que tenho chamado o sector do nacionalista revolucionário que é ainda forte. Mas de todo o modo, José Maria Neves é o maior trunfo eleitoral que o PAICV tem para as legislativas e portanto o PAICV não podia dar um tiro no pé e todos se juntaram para apoiá-lo na corrida à liderança do partido e para se candidatar, em princípio, ao cargo de primeiro-ministro.
Pode acontecer que a contrapartida desse apoio seja que José Maria Neves não indique o candidato presidencial, mas que seja o sector pirista a fazê-lo. E olhando deste ponto de vista, talvez a candidatura do Aristides Lima possa vir a ser privilegiada por isso mesmo. Mas há o outro lado, alguns handicaps de Lima, por exemplo, muito criticado pelo seu desempenho com presidente da Assembleia Nacional, visto por muitos como autoritário e parcial.
EXPRESSODASILHAS.SAPO.CV-POR NORBERTO SILVA
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