A autenticidade libertadora(?) do senhor Santiago no Sal, as presidenciais, ainda a Constituição e a fidelidade aos partidos – a propósito de felicidade interior, de humanidade e dos «bichos que também de vez em quando não somos», e a despropósito da Praça Alexandre Albuquerque.
1. Em momentos de minguada felicidade interior ou de alguma decepção pelas coisas que (nos) vão acontecendo, a todos seguramente, há por vezes minudências que nos fazem voltar à crença e ao sossego de uma nossa pertença, afinal, a uma dimensão de humanos. A uma dimensão que (convicção nossa, dos Homens) se separa da de outros seres com que partilhamos este planeta, este nosso pequeno espaço. Não falamos apenas de «territórios» fechados como a família, os amigos, o casal, os cúmplices da vida, os colegas, a escola, atravessados quase sempre e de forma proeminente pela emoção, quantas vezes pela irracionalidade. Mesmo num espaço como o da política, da acção política, onde a racionalidade impera quase invariavelmente, mormente no domínio dos responsáveis e dos «aparelhos» (partidos, governos, grupos parlamentares), surge amiúde momento de afirmação daquela, pelo menos pretensa, dimensão de humanidade. Daquela fresca, irradiante e irrenunciável condição de «bichos que de vez em quando também não somos», como dizia um poema que nos vem à memória.
Num encontro havido há dias no Sal, organizado por um grupo de incentivo a uma nossa candidatura presidencial, no final das intervenções dos organizadores e do convidado e do Presidente da Câmara Municipal, Jorge Figueiredo, pediu a palavra um senhor então por nós desconhecido, mas que vim a saber chamar-se SANTIAGO (apenas o nomeio pelo facto de as suas declarações terem sido públicas perante uma plateia de várias dezenas de pessoas e da comunicação social). Encheu-nos de elogios (merecidos ou não, não interessa por agora), disse que tem acompanhado a nossa trajectória política e pessoal, mostrou-se muito agradado com a nossa intervenção centrada no núcleo essencial da função presidencial num sistema de governo como o nosso, sem deixar de revelar que nutria muita simpatia pela eventualidade da candidatura. Depois, e quase que a pedir desculpa ou a fundamentar justificação ou lamento, o senhor Santiago, num estilo muito pousado mas fluente, assumindo-se «do PAICV», confessou publicamente que aguardaria indicação do candidato que o seu partido apoiaria e que, portanto, não poderia votar em nós (se fosse caso disso, naturalmente). Acabou formulando umas perguntas ao orador.
2. Ficámos muito sensibilizados com aquela frontalidade, com uma tal autenticidade, ainda mais expressa em público, num discurso sereno, educado e, diríamos, contagiante na sua plástica candura. Apesar de – também devemos dizê-lo – termos reservas quanto àquela forma de «ler», de ponderar e de decidir escolhas presidenciais no tal nosso sistema, tal e qual vem desenhado na Constituição da República, que não pretendeu que as eleições presidenciais fossem de extracção partidária, precisamente em nome do modelo de sistema de governo instituído (um Presidente que possa ser árbitro do sistema político, um seu «moderador», deve ter condições de isenção e imparcialidade). É verdade que também sabemos, até de experiência pessoal, que a prática política (e constitucional) anda muito arredia de um tal desenho da Lei Fundamental, mas continuamos ainda convencidos de que a melhor postura será a de procura paciente e gradual de aproximação entre uma e outra vertente e não a de uma fatalista, «realista» e mais fácil e sedutora conclusão de que, então, «mais vale» deixarmos de «fazer de conta» e mudar o texto constitucional, fazendo com que ele se «adapte» à «prática». Ou, dali vai um passo curto e eficaz, a defesa de um mirífico e esbelto presidencialismo, que, por sinal, não muito de longe de nós, descamba visivelmente para modelos de poder pessoal.
Postura metodológica que advogamos pelo menos enquanto o sistema não for testado suficientemente e até porque ele tem funcionado de forma satisfatória em quase vinte anos de vigência.
Ecos vindos até nós dão conta de que as propostas de revisão constitucional não atingem o essencial do modelo vigente, bem que se sugira limitar o condicionalismo do exercício do poder presidencial de dissolução do Parlamento. Felizmente, dizemos nós!
Bem, este foi um parêntesis de racionalidade num texto que, do diálogo com o senhor Santiago, queríamos ver e ter como de teor mais humanista, mais do nosso estar-com-os outros.
3. Há uns meses, pouco tempo depois da eleição da equipa camarária da Praia, chefiada por Ulisses Silva, neste espaço de jornal salientava o facto de pequenas coisas realizadas, como o embelezamento de algumas vias da capital, sinais de um maior empenho no saneamento do meio, «desentupimento» de ruas ocupadas ilegitimamente por vendedores, apontarem para uma melhoria do aspecto da cidade, tornando-a mais aprazível e menos desumana. São quase dois anos passados, creio, da eleição, e ficamos com a impressão de que há um afrouxamento no ritmo, no entusiasmo, na motivação para a mudança. Ou estaremos enganados? Por exemplo, há minúcias, petites choses, aparentemente pouco importantes na economia do trabalho decisivo que a capital exige (as chamadas obras «estruturantes», a questão da polícia municipal, a problemática da energia, etc.), mas que se mostram simbólicas para os praienses. Falemos da praça central, Alexandre Albuquerque que virou 12 de Setembro e retornou à denominação primeira… será tão difícil pô-la jeitosa, apetecível para as crianças que a demandam diariamente, «arrumá-la», despojá-la dos contentores e caixotes que parecem querer desventrá-la, iluminá-la devidamente e livrá-la da escuridão em que está mergulhada?!
Pode surgir este reparo como insignificante mas não se lembram da história do «relógio do Kremlin»?!
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