terça-feira, 20 de outubro de 2009

AFRICA:Seis razões para Mo Ibrahim não ter atribuído o prémio


Criada em 2006, a Fundação Mo Ibrahim todos os anos entrega um prémio de cinco milhões de dólares a um ex-líder africano. Joaquim Chissano e Festus Mogae foram os vencedores. Este ano, o júri não designou ninguém.
Quando o milionário sudanês Mo Ibrahim anunciou a entrega de um prémio de cinco milhões de dólares (3,4 milhões de euros) a um ex-líder africano que se tenha distinguido pela boa governação, salvaguardou logo que por vezes "poderá não ser entregue". Foi o que aconteceu ontem. Ao terceiro ano, o júri encarregue de designar o vencedor e que inclui o ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan, os Nobel da Paz Mohamed ElBaradei e Martti Ahtissari, e a ex-presidente da Irlanda Mary Robinson, admitiu, numa conferência de imprensa em Londres, ter analisado vários nomes - entre os quais o sul-africano Thabo Mbeki, o nigeriano Olusegun Obasanjo e o ganês John Kufuor - mas não ter chegado a nenhuma conclusão. Fiel às suas regras de sigilo, a Fundação não revelou as razões para não haver vencedores. Mas os conflitos, os golpes militares, a fome, a corrupção, os líderes que se eternizam no poder e a luta contra a sida serão alguns dos motivos que dificultaram a tarefa da júri.
Sem governo efectivo desde 1991, a Somália é um bom exemplo de um país africano cujas autoridades políticas não conseguem garantir a segurança e estabilidade. Os confrontos entre senhores da guerra e exército já fizeram mais de um milhão de mortos. Já este ano, as milícias al-Shabab, ligadas à Al-Qaeda, lançaram ataques contra a capital, Mogadíscio. Mas a Somália não é o único caso de países africanos onde os conflitos persistem. A República Democrática do Congo continua a braços com o que a BBC chama a "guerra mundial africana". Apesar dos esforços do Governo de Joseph Kabila, a violência mantém-se, sobretudo no Leste. O Sudão é outro caso de país cujo desenvolvimento foi travado pela guerra. Depois do acordo no sul que em 2005 pôs fim a 21 anos de conflito entre governo e rebeldes, o Darfur tornou-se no maior problema com a perseguição das milícias árabes às populações daquela província do Leste a causar dois milhões de deslocados e 300 mil mortos desde 2003.
Ainda mal passara a surpresa da morte do presidente Lansana Conté, em Dezembro de 2008, e já o exército da Guiné Conacri anunciava que havia tomado o poder. O novo homem forte chamava-se Moussa Dadis Camara. E se o capitão prometeu fazer eleições às quais não se candidataria, a verdade é que já se arrependeu do que disse. A Guiné Conacri promete assim continuar nas mãos dos militares que a governam desde a independência, em 1958, e fizeram dela um dos países mais pobres de África Ocidental, segundo a BBC. Habituada a golpes está também a Guiné Bissau. A antiga colónia portuguesa tem vivido uma sucessão de golpes desde que se tornou independente. O último foi em Março passado, quando o exército matou o presidente Nino Vieira, alegadamente para vingar a morte do chefe do Estado-Maior, Tagme Na Waye. Esta tradição do poder pela força não é exclusiva das Guinés, basta pensar que o mesmo aconteceu na Mauritânia, em Agosto de 2008.
Quando se olha para o relatório anual da organização Transparency International, a Somália surge em último lugar na lista de 2009 dos países mais transparentes do mundo. Num relatório em que a Dinamarca aparece como o país menos corrupto, seguido da Nova Zelândia e Suécia, o fundo da tabela fica entregue aos países em guerra - Iraque e Afeganistão - ao Haiti e aos africanos. Além da Somália, onde os confrontos e a incapacidade para lidar com a fome e as doenças travam o desenvolvimento, o Sudão e a Guiné Conacri também surgem nos últimos lugares do Global Corruption Report.
Com a morte no passado mês de Junho de Omar Bongo, que governara o Gabão durante 42 anos, o líbio Muammar Kadhafi tornou-se no líder político eleito há mais tempo no poder - desde o seu golpe contra o rei Idris, em 1969. O eterno coronel surge no primeiro lugar de um lista em que é acompanhado por outros líderes africanos. É o caso de Teodoro Obiang, à frente da Guiné Equatorial desde 1979, do angolano José Eduardo dos Santos, no poder desde a mesma altura, ou de Robert Mugabe, o todo-poderoso Presidente do Zimbabwe, que lidera desde 1980. E a acreditar nas mudanças que Uganda, Chade e Camarões fizeram nas suas Constituições para permitir que os seus líderes se perpetuem no poder, Kadhafi vai ter concorrência à altura.
A África subsariana é mais afectada pela sida do que qualquer outra região do mundo. Segundo dados da ONUsida há naquele continente 22 milhões de infectados com o VIH - dois terços do total mundial. E se a incidência da doença varia de país para país, a verdade é que em todos eles reduz de forma significativa a esperança de vida da população. A doença atinge sobretudo as camadas mais jovens - essenciais para o desenvolvimento de um país. Se querem combater este flagelo de forma eficaz, os líderes políticos africanos têm pela frente três grandes desafios aos quais terão de dar uma resposta rápida nos próximos anos: fornecer medicamentos a todos os infectados; convencer os saudáveis da necessidade de se protegerem da doença e ajudar os órfãos e familiares de todos os que estão afectados pela doença.
O último relatório da FAO revela que mais de mil milhões de pessoas no mundo sofrem de fome. E segundo o relatório da agência da ONU, os oito países que mais sentem a falta de alimentos situam-se todos na África subsariana. Mais, dos 29 países analisados pelo Índice Global da Fome, 21 são africanos. Os investigadores chegaram à conclusão que a República Democrática do Congo e o Burundi são os casos mais difíceis. A má governação é uma das razões apontadas para o agravamento da fome.
DN.PT-Por HELENA TECEDEIRO

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